O comissário para os Direitos Humanos do Conselho da Europa, Nils Muiznieks, alerta que a crise económica em Portugal está a gerar mais abandono escolar e há um "risco real" de aumento do trabalho infantil.
No final da visita oficial a Portugal, que durou três dias, Nils Muiznieks diz, em entrevista à Lusa, que recebeu informação relativa à situação das crianças que aponta para um "aumento de pobreza, de abandono escolar, de negligência parental e de violência e abuso".
Não
tendo dados sobre "caso concretos" de trabalho infantil, o comissário
recebeu do Provedor de Justiça a indicação de "um aumento de queixas"
relacionadas com os direitos das crianças, nomeadamente com abandono
escolar e trabalho infantil.
"As crianças sofrem
muito durante as crises", diz, realçando que o trabalho infantil "ainda
não é um problema generalizado, nem houve um retrocesso até à dimensão
que já teve no passado, mas há um risco real, no contexto da crise, com
as crianças a deixarem a escola e as famílias em situação difícil, de o
fenómeno voltar".
Nesse sentido, apela, é preciso
ter em atenção "a situação dos grupos vulneráveis, que têm mais
dificuldade em defender os seus direitos", nomeadamente "crianças,
idosos, pessoas com deficiência, imigrantes e membros da comunidade
cigana".
A situação daqueles grupos em Portugal oferece "algumas preocupações" e "deve ser tida em conta quando se corta orçamentos e cria programas", destaca o comissário.
"É
preciso assegurar que a assistência chega aos que mais precisam e que
os grupos vulneráveis não são afectados desproporcionadamente pelos
cortes orçamentais", defende, realçando que "o Governo está ciente dos
problemas".
No entanto, considera que o risco não
aumentou só para as crianças. "Os idosos estão a ser retirados de lares
por pessoas que querem beneficiar das suas pensões por não terem outros
meios financeiros de apoio e os abusos contra idosos estão a aumentar",
relata.
Simultaneamente, verifica-se por toda a
Europa "uma feminização da pobreza", já que "as mulheres são mais
afectadas pela crise do que os homens" e "as meninas estão
frequentemente em maior risco do que os rapazes, sobretudo entre os
imigrantes e a comunidade cigana", diz.
Outro
factor comum em situação de crise é "o enfraquecimento das instituições
nacionais de direitos humanos, como os provedores e os organismos para a
igualdade", refere. Porém, neste caso, Nils Muiznieks deixou elogios ao
Governo português.
"Estou muito contente porque
as autoridades portuguesas não cortaram o financiamento ao Provedor de
Justiça e ao ACIDI [Alto Comissariado para a Imigração e o Diálogo
Intercultural]", instituições que desempenham "um papel fundamental em
tempo de crise", frisa.
O comissário regista
também como boa prática a existência de três linhas de atendimento da
Provedoria de Justiça - para crianças, idosos e pessoas com
deficiência-, que, realça, têm registado "mais queixas sobre
negligência".
"Em tempos de crise e de corte de
orçamentos, toda a gente sofre, mas alguns grupos sofrem mais do que
outros. As autoridades portuguesas estão conscientes disso", frisa o
comissário, elogiando o Programa de Emergência Social, aprovado pelo
Executivo em Agosto do ano passado.
"É cedo para
dizer" se aquele programa será suficiente para "ajudar os que estão mais
em risco", mas "é um bom passo", considera.
"Encorajamos
as autoridades portuguesas a monitorizar o impacto do Programa de
Emergência Social e a pôr os direitos humanos no coração do processo
orçamental", apela, aconselhando o Governo a dialogar com sociedade
civil e sindicatos.
O Conselho da Europa tem
insistido na necessidade de proteger e incluir a comunidade cigana, que
"está sempre numa posição muito vulnerável, especialmente em tempo de
crise". Em Portugal, "há boas medidas", mas, realça Nils Muiznieks,
falta aprovar a estratégia europeia para a inclusão dos ciganos.
Fonte: Correio da Manhã
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