Eles dizem que não é fácil ser jovem numa sociedade que torce o nariz às suas ideias. Reúnem-se para partilhar experiências e debater o que os preocupa. O bullying, a situação do país, a saúde, o aumento das propinas, o acesso ao mercado de trabalho são temas de conversa. Esta é a última peça sobre o que pensam os jovens que fazem parte do projeto Dream Teens.
Por Sara R. Oliveira do Educare.PT
André Cipriano Sousa tem 17 anos, é de Vila Real, e faz parte do Dream Teens, projeto que envolve jovens de todo o país que se reúnem para discutir temas que estão na ordem do dia. Está contente por poder contribuir para que o futuro possa ser diferente. A saúde, a imagem do corpo, o bullying, a situação do país são alguns dos temas de conversa. O aumento das propinas também. O futuro, desabafa, “antevê-se muito enublado”. “Muitos jovens estão com dúvidas sobre o futuro e se os seus esforços de hoje irão compensar.” “Vivemos num país que não dá segurança para o futuro e que nos põe a pensar se vale a pena cá ficar. Ficamos com receio de ter de abandonar o país para poder construir uma vida digna e com mais possibilidades”, diz. Os números da emigração assustam-no. “E se por cá decidimos ficar, até mesmo sabendo que há emprego na nossa área, não temos certezas sobre em que parte do país ficaremos e em que condições de emprego, logo as expectativas não são favoráveis.”
André gosta do que vê nas escolas – escolas bem equipadas, limpas, com professores capazes, boa comida nas cantinas, escolas seguras – mas sugere algumas alterações. “Muitos professores não se empenham nas aulas e no acompanhamento dos seus alunos, verifica-se um mesmo padrão que consiste em ‘despachar matéria’ para os alunos não ficarem atrás das outras turmas ou do programa”. O que, em seu entender, “não permite aos professores tentar novas pedagogias de ensino, mesmo que pequenas, como aulas dedicadas a tirar dúvidas, já que os apoios são escassos, ou usar música para ensinar línguas estrangeiras”. Outra sugestão. “Se na mesma escola se verificasse uma discrepância muito grande na rapidez de compreensão dos alunos face à matéria dada, podia-se implementar a ideia de aulas-nível, em que os alunos mais rápidos a compreender não tivessem de esperar pelos outros, o que aumentaria o progresso individual para ambos os grupos ou turmas.” Os professores continuam a ser uma referência. André dá como exemplo a sua mãe que “se esforça por dar as melhores aulas, tentando compreender os seus alunos e a inovar na sua educação”.
Vanessa Reis, tem 17 anos, é de Loulé, e queria ter uma voz mais ativa na sociedade, sempre fez questão de dar a sua opinião e tentar mudar o que acha que está mal. O Dream Teens surgiu e não pensou duas vezes. “A experiência está a ser incrível.” Sentiu-se em casa, lado a lado com jovens que se preocupam com o país onde vivem. “Hoje não sou apenas uma jovem, hoje sou uma jovem com uma voz ativa na sociedade e que pretende continuar a tentar mudar a sociedade para melhor com todos os Dream Teens”. “Ser jovem não é fácil nem difícil, existem momentos altos e baixos.” Sente que hoje é mais fácil, há menos preconceitos, as mentes estão mais abertas a novos conhecimentos. E há muitas alegrias em ser-se jovem. “As novas experiências, os momentos, as loucuras (sensatas), o saber que existe alguém do nosso lado para tudo, ter amigos com quem podemos contar, alguém para rir, chorar, desabafar.”
Vanessa diz que é preciso acreditar no futuro, ter confiança que o país vai melhorar. O bullying e as dificuldades em ingressar no mercado de trabalho são, no entanto, temas em que pensa. E a emigração também assusta? “Assusta ver tanta gente abandonar o seu país de origem, embarcar para o desconhecido por não conseguir ingressar no mercado de trabalho em Portugal. Assusta mas se está mau cá dentro, tem que se tentar lá fora. Esperemos que isso um dia mude.” E o sistema de ensino? Vanessa sente que há professores menos motivados, que o corte nos salários se sente nas escolas e que isso se repercute em quem aprende. “Eles têm de ver que dentro da sala de aula está o futuro do país.” Se pudesse mudar alguma coisa no sistema de ensino, sugeria que não colocassem professores-estudantes a dar aulas a anos de exames, já que, na sua opinião, “acabam por não ter tempo e não darem a matéria como deve ser”.
Patrícia Cunha tem 15 anos, é das Caldas da Rainha, e quis fazer parte dos Dream Teen para mostrar que a voz dos jovens tem peso. Não é fácil ser jovem numa sociedade que torce o nariz às ideias dos mais novos. Mas há alegrias em ser-se jovem. “As maiores alegrias é tudo o que vivemos, as experiências que partilhamos com os outros, ter bons amigos e passar momentos divertidos com eles, ter uma família que nos apoia e nos deixa felizes.” “Acho que a sociedade nos deixaria muito mais felizes se não nos tentassem tornar adultos aos 15, 16 anos. Somos demasiado novos para certas decisões e já não somos crianças para outras. É necessário perceberem isto”, avisa.
O futuro e as condições de vida preocupam os jovens. Patrícia faz várias perguntas: Será que vamos conseguir ter um emprego decente, em que somos bem remunerados e gostamos do que fazemos? Será que vamos conseguir chegar ao ensino superior com o aproveitamento que queremos? Se conseguirmos chegar lá, os pais terão capacidades financeiras para suportar esses encargos? “São estas perguntas sem resposta que sobressaltam muitos dos jovens do nosso país.” E surge a possibilidade de emigrar. “Sim, ainda acreditamos num futuro. No entanto, pode já não ser em Portugal.” Depois do secundário, Patrícia quer continuar a estudar, mas ainda não tem certezas quanto ao curso. Quer entrar em Medicina, mas será a média a ditar o seu destino. As engenharias são a sua segunda opção.
Para Patrícia, o sistema de ensino está fragilizado e não percebe por que razão se continuam a valorizar tanto as notas dos exames para entrar na universidade. “Os professores estão pressionados pelo Ministério da Educação, as metas a cumprir são demasiado exigentes, tanto para professores como para alunos, o tempo é escasso, os professores dão a matéria ‘a correr’”. E, por vezes, a colocação dos professores tarda e prejudica os alunos. “Os professores tentam de tudo para nos ajudar, mas acabam por estar demasiado cansados para o conseguir, devido ao número de alunos que têm.” E, já agora, os horários deviam ser alterados pois, na sua perspetiva, “é incompreensível como é que os alunos conseguem estar concentrados nas aulas depois de terem entrado às 8h20 e só saírem às 18h30”.
Um futuro fora do país
Maria Teresa Carreira tem 17 anos, vive em Salvaterra de Magos, e gosta da liberdade que o Dream Teens proporciona. Até porque, na sua opinião, a voz dos jovens deve ser valorizada como deve ser. “Aprendi imenso até agora e espero aprender muito mais.” A saúde, o bem-estar, o futuro, a pressão da sociedade perturbam a jovem geração. “Ser-se jovem não é tarefa fácil, mas também não é algo do outro mundo. O importante será termos uma boa perceção daquilo que nos rodeia para não cairmos em ilusões”, refere. A questão é ter esperança num bom futuro, só que as informações que chegam do mercado de trabalho não são animadoras. “Ficamos desiludidos com o pouco valor que dão à mão de obra jovem, que consideramos ser ótima.” “Já começámos a interiorizar a ideia de termos de construir um futuro fora do nosso país”, acrescenta.
Maria Teresa tem observações a fazer quanto ao sistema de ensino. Por um lado, muita pressão à volta dos testes, por outro, falta de acompanhamento. “Deveria existir um sistema de avaliação no qual estivessem presentes os aspetos a melhorar, de modo a termos uma maior noção daquilo que erramos, para podermos evoluir mais depressa. Assim, as avaliações não seriam apenas quantitativas mas também qualitativas”. Os professores são, na sua opinião, uma referência que ajudam os alunos a desenvolver um maior espírito crítico.
Marta Martins, tem 19 anos, é da Póvoa de Varzim, e valoriza a experiência do Dream Teens. Ter voz na sociedade é importante. “Hoje em dia, há cada vez mais jovens que não acreditam no futuro, há cada vez mais jovens que não têm possibilidades de estudar, que são obrigados a abandonar o ensino para ajudarem a família a nível económico”, comenta. Por isso, uma das maiores alegrias é acreditar que os jovens podem construir o próprio futuro de uma forma positiva.
“Os jovens precisam de ser ouvidos, terem a possibilidade de dar a sua voz nesta sociedade cada vez mais egoísta. Os jovens são o futuro do país.” Joana Filipa, de 17 anos, de Tavira, avisa que o país tem de dar ouvidos aos mais novos. O futuro e a falta de perspetivas inquietam, mas os jovens querem acreditar no seu futuro e no futuro do país, mas, por vezes, quem está no topo da hierarquia não escuta as vozes dos mais novos. “A geração atual prefere arriscar e emigrar à procura de melhores condições de vida.”
Joana acredita num futuro melhor e sabe que os jovens de hoje têm melhores condições do que antigamente. Na sua opinião, o sistema de ensino progrediu, houve renovação e melhorias nas matérias dadas. O que está mal é a confusão na colocação dos professores. Professores que podem ter um lugar especial no coração dos alunos. “Se os professores criam e permitem uma maior amizade e ‘liberdade’ entre aluno e professor, consequentemente o aluno irá ter o professor como referência”, refere.