Inúmeras são as problemáticas que envolvem a educação. Hoje em dia, por exemplo, está na moda falar sobre bullying. E este é apenas um dentre tantos assuntos dilemáticos da educação atual. Um aluno meu, de ensino médio, disse esses dias que ele sofre bullying por parte dos próprios professores e da direção da escola. Ele defendeu que quando a escola o obriga a retirar o seu boné, em sala de aula, sob a justificativa superficial de que “quem usa boné é bandido”, na verdade se está disseminando um preconceito contra todo um grupo social, que usa boné, mas - óbvio - não é bandido, necessariamente. No final, o aluno riu e disse que esse é o “bullying do boné”.
Eu, como professor, inevitavelmente, questiono-me sobre os debates (e embates) que compõem a nossa educação dita ‘pós-moderna’. Esta semana o que ficou em evidência foi essa regra de proibição dos bonés em classe. Alguns alunos brincaram: “Será que só por que eu tô usando boné, o conhecimento não vai entrar na minha cabeça?” [sic]. Outros falaram sério: “Se usar algo na cabeça fosse desrespeito mesmo, os policiais não usariam boinas e o papa não usaria aquele “chapeuzinho” lá!” [sic]. Polêmica e divergente, a discussão parecia não ter fim na escola. Teve até quem não usa o boné e passou a defendê-lo; e teve quem usa, e passou a questionar o uso. Foi interessante de ouvir as argumentações e a ousadia dos jovens em questionar.
Dentro da filosofia há pensadores, como o filósofo francês Michel Foucault, que levanta o debate sobre as regras e as normatizações sociais, às vezes dirigindo seu discurso diretamente ao âmbito escolar. Ele trabalha (e crítica em demasia) questões relacionadas à Disciplina ou Disciplinarização dos jovens, que podem “domesticar” o ser humano, o deixar impotente, “corpos dóceis”, como ele chamou. Dóceis a uma autoridade social e política que, por causa dessa disciplina imposta, tem a sociedade nas mãos. Uma sociedade não-crítica e submissa. Tais formas de Disciplinarização passam, necessariamente, pelas escolas. É com regra proibitiva simples (como retire seu boné) que se domestica os jovens a se submeterem, sem questionar, às autoridades.
Mas há os que dizem que os jovens de hoje estão sem limites. E impor as regras é bom para fazê-los entender que existe autoridade e lei. Porém, será que essa atitude desregrada e de crítica ao poder não pode ser vista como uma resposta à histórica imposição ditatorial que sempre se viveu no Brasil pré-democrático? Uma hora tivemos reis ditando a vida dos brasileiros, outra hora foram os militares no poder, e agora são os poderes legislativo, executivo e judiciário (tantas vezes corruptos) que escolhem as leis e como será a vida do povo. Nossos jovens devem mesmo aprender a sempre abaixar a cabeça diante do poder? É assim que vamos ensinar Democracia, tirando a voz e a vez da juventude e ensinando-lhes a sempre “calar a boca” diante de autoridades? Acho que não.
Todos sabemos o quanto que o ‘meio termo’ é difícil. Mas precisamos desse equilíbrio em nossas escolas. Temos de aprender a por limites sem impor verdades absolutas; discutir regras em vez de simplesmente usar a força para fazê-las cumprir. Não é fácil. Mas se queremos garantir um Brasil democrático no futuro, de brasileiros com coragem e sabedoria para não sofrerem na mão de qualquer déspota político que deseje o poder, então teremos que começar hoje a ouvir os jovens e não apenas gritar com eles. Às vezes a ordem de “Retire o boné!” pode se desdobrar na domesticação e submissão desses jovens, que não aprenderão só disciplina, mas desenvolverão “corpos dóceis” que só servem como massa de manobra nas mãos de ditadores, como tanto alertou o filósofo Foucault. É preciso repensar isso com urgência.
O autor, prof. Wellington Martins, é graduado em Filosofia e pós graduando em Psicopedagogia (USC), am.wellington@hotmail.com
Fonte: Jornal da Cidade de Bauru
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