Violência nas escolas públicas do Grande Rio revela dados alarmantes
Pesquisa realizada uma por professora da UFF mostra que 98% dos
estabelecimentos de ensino registram algum tipo de agressão. Estudo foi
realizado entre 2010 e 2011
Uma pesquisa coordenada pela professora Marília Etienne Arreguy,
da Universidade Federal Fluminense (UFF), com foco nas escolas públicas
do Grande Rio, revela dados alarmantes: 98% das instituições analisadas
apresentaram algum indício
de violência. O estudo, intitulado “Relações entre psicologia e
educação – mapeamento das práticas”, que teve início no segundo semestre
de 2010 e se estendeu até o fim de 2011, percorreu 65 escolas – 43 em
Niterói, 13 no Rio de Janeiro – sendo um Centro de Referência de
Educação, sete em São Gonçalo e duas em Itaboraí. Das instituições, 83%
eram públicas e 17% particulares.
O resultado: 56% dos profissionais das determinadas escolas disseram
existir violência, apenas 31% declararam que embora exista não é uma
coisa frequente e 11% relataram que a situação é recorrente e
preocupante. Apenas 2% afirmaram não existir. Os tipos são os mais
variados: bullying, discriminação racial, sexual; agressão física,
ameaça, seja na relação aluno com professor e vice-versa; vandalismo e
até caso de roubo. Foi verificado que algumas instituições, embora
poucas, realizam campanhas para combater o problema. A maioria com
enfoque para o bullying.
A pesquisa faz parte de um projeto de ensino, no qual aproximadamente
200 alunos da Faculdade de Educação da UFF foram responsáveis pela
coleta dos dados. Coordenados pela professora e auxiliados pelo monitor
de psicologia, Rafael Soares, os dados codificados na pesquisa fazem
parte de uma primeira etapa do estudo, onde foram ouvidos pedagogos,
diretores das escolas e psicólogos.
“Esta é uma pesquisa piloto, devido à complexidade da questão. Não
podemos tomar esses dados como absolutos, mas são, sem dúvida, índices
do que se apresenta na realidade. Agora, o estudo vai seguir para uma
segunda parte, onde pretendemos nos aprofundar nas reflexões para
debater o contato entre profissionais de psicologia e educadores”, disse
a pesquisadora, que expôs uma visão geral do estudo. “O que encontramos
em campo foi uma defasagem teórica muito grande dos profissionais para
lidar com os alunos. Quando foi citado o tema violência, falava-se em
bullying”.
A professora acredita que a ênfase no tratamento do bullying possa
ser um equívoco. “O bullying focaliza a violência no indivíduo, o que
vai contra outra perspectiva, que entende que o problema é uma questão
mais ampla, reflexo de um sistema social e familiar, que seria o
verdadeiro foco, e onde, de fato, deveria ser tratado”, disse.
Ela atribui a expansão do problema a outro dado levantado pela
pesquisa: a ausência de psicólogos nas escolas. “Apenas 25% das escolas
pesquisadas têm psicólogos. Essa questão é muito grave, já que são esses
profissionais que estariam aptos a identificar a origem do problema em
cada estudante, e assim, no próprio ambiente escolar”, declarou.
Ela citou que a situação abre margem para mais uma questão. “Por
conta da ausência desse profissional, 74% encaminham os alunos
problemáticos - os agressivos ou com déficit de aprendizagem - para o
serviço público de saúde, transferindo o problema para outro órgão e
existe mais uma dificuldade, a resistência da própria família em
levá-los para se consultar”, disse.
Outro dado revelado foi que 42% dos profissionais ouvidos citaram que
a violência nas instituições seria um reflexo de situações familiares.
“Acredito que isso tenha fundamento, tendo em vista o distanciamento
entre pais e filhos, devido a fatores como saúde, questões financeiras e
trabalhistas. Mas não podemos generalizar. Muitas vezes é feita essa
transferência de culpa, como uma forma de tentar reduzir o problema”,
pontuou Marília.
Congresso – Os dados da pesquisa serão apresentados
no III Ciclo Internacional de Conferências e Debates, que será realizado
nos dias 23 e 24. A terceira edição do evento será sediada pelo IP-USP e
pela FEUFF. Na etapa que ocorrerá na UFF, intitulada “Crises na esfera
educativa: violências, políticas e o papel do pesquisador”, sua
expressão será voltada para a discussão do problema da crescente
violência nas escolas, vislumbrando sobretudo a troca de experiências
entre pesquisadores e profissionais da área de saúde e educação, no
Brasil e na França. O evento vai desencadear assinatura de cooperação
internacional entre a UFF e a Universidade de Paris Diderot, o que
promete facilitar o intercâmbio entre alunos das universidades para
estudos.
Algumas ações
A Prefeitura de Itaboraí informou que para prevenir atitudes e
comportamentos violentos de alunos, a Secretaria de Educação e Cultura
criou em novembro de 2010 uma lei municipal instituindo medidas de
conscientização, prevenção e ações interdisciplinares e de participação
comunitária no âmbito das escolas públicas e privadas.
A Secretaria Municipal de Educação de São Gonçalo declarou que
trabalha para que a situação de violência seja a menor possível nas
escolas. Foi informado que nos casos em que o desentendimento é pontual,
não sendo uma característica da personalidade do indivíduo, os alunos
que desencadearam o ato violento são encaminhados à direção e recebem
instruções sobre a convivência pacífica, respeito às diferenças e
tolerância. Em casos mais graves, onde o comportamento é reincidente ou é
identificado ato violento constante, o aluno é encaminhado ao Conselho
Tutelar, que, junto à escola, investiga a relação do aluno com a família
e o contexto social onde vive. Através do Conselho Tutelar, a criança e
o adolescente têm acesso a tratamento psicológico e acompanhamento
social.
Já a Prefeitura de Niterói informou que só vai se pronunciar sobre o
assunto assim que a pesquisa for divulgada. A Prefeitura do Rio de
Janeiro não se pronunciou. O Sindicato das Escolas Particulares do
Município do Rio de Janeiro (Sinepe Rio) e o Sindicato Estadual dos
Profissionais de Educação (Sepe) não se manifestaram.
Fonte: Engenhoca
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