Cultura da violência

Adquire crescente destaque o debate político e midiático sobre os aumentos nos índices de violência e criminalidade entre adolescentes, alguns deles mal chegados à puberdade. Além da nefasta incidência, levada a extremos, do "bullying" nas escolas, também prolifera a formação de belicosas gangues na periferia das grandes cidades, a maioria delas ligada ao narcotráfico.

Estudiosos afirmam que o universo das gangues juvenis passou por substancial transformação, desde os anos 1950 até hoje. No início, esses grupos rebeldes associavam atitudes transgressoras a uma afirmação pessoal contra os valores vigentes, usando a força física para demonstrar virilidade e independência. Assim eram os jovens conhecidos como "rabos-de-burro", arruaceiros de classe média que aterrorizavam as pacatas famílias fortalezenses de meados do século passado, invadindo festas, depredando o patrimônio público e roubando veículos para fazer farras.

Só a partir da década de 1970, com a crescente insegurança social, o aumento do desemprego, a precarização do ensino e o aprofundamento da segregação socioespacial pelo crescimento das cidades, o mundo das gangues veio a assumir seu aspecto mais predador e marginal.

Os participantes dos bandos juvenis, anteriormente pertencentes à classe média e até mesmo às de maior poder aquisitivo, passaram a ser recrutados entre as famílias mais pobres dos subúrbios, desligadas da sociedade assalariada e habituadas a conviver com problemas característicos aos bolsões de pobreza.

Esse novo quadro gerou o enfraquecimento do controle familiar sobre os filhos, agora senhores de seus próprios destinos e entregues ao desprezo e à crueldade das ruas.

As carências no campo educacional contribuíram de maneira notória para o aceleramento desse processo desagregador. Comprovam renomados sociólogos que as dificuldades encontradas na aprendizagem dos conhecimentos básicos conduzem à evasão escolar, a qual, em inúmeros casos, leva a criança ou o adolescente a procurar a "proteção" supostamente concedida pelos componentes das gangues organizadas. De acordo com tese elaborada por sociólogos da Escola de Chicago, a existência de um "polo delinquente" em um bairro transforma-o em área de recrutamento e ensino de práticas marginais, denominadas pelos estudiosos de "oportunidades desviantes". Os delitos evoluem do furto ao roubo, em seguida partindo para atos mais graves, tais como sequestros, tráfico de drogas e, por fim, assassinatos.

Segundo o francês Gérard Mauger, autor do livro "A sociologia da delinquência juvenil", a prisão é considerada entre as gangues como garantia de reputação e prestígio, por favorecer o desenvolvimento de relações no mundo da delinquência profissional e o conhecimento de seus códigos.

As cadeias se institucionalizaram como escolas de marginais, fazendo com que se torne inadiável prioridade uma substancial reforma no sistema presidiário brasileiro, em decisão que não se restrinja a declarações circunstanciais de indignação moral diante de uma realidade tão aviltante para a imagem do País.

Fonte: Diário do Nordeste