RIO - Mãe de um menino hoje com 11 anos, uma psicopedagoga, moradora da Zona Norte, conta que passou, entre 2009 e 2010, por um dos períodos mais difíceis de sua vida. Poucos meses após ter matriculado o filho numa nova escola, percebeu as primeiras marcas de agressão na criança. A situação foi se agravando e, apesar dos apelos, ela diz ter sofrido com o descaso do colégio. O relato exemplifica aquele que ainda parece ser um tabu em muitas salas de aula: o bullying. Apesar de uma lei estadual, sancionada em setembro do ano passado, determinar que as instituições de ensino públicas e particulares notifiquem todos os casos de bullying à polícia ou aos conselhos tutelares, um levantamento feito pelo GLOBO mostra que a regra não tem sido obedecida na prática.
— Meu filho chegou ao ponto de ter uma crise renal em consequência do que sofria na escola. Descobrimos que outros alunos não o deixavam ir ao banheiro, alegando que assim ele estaria cumprindo uma prova para poder pertencer a um grupo. Levando em conta que o bullying resulta em lesões corporais, ofensas morais e danos psicológicos, a escola não poderia ter ficado inerte aos fatos — reclama a psicopedagoga, que teve que trocar o colégio da criança e está finalizando um livro contando os problemas por que passou.
Sem encontrar eco na instituição de ensino, um dos caminhos adotados pela mãe foi procurar o Conselho Tutelar da região. A partir da lei do ano passado, a iniciativa obrigatoriamente deveria ser das próprias escolas, sob pena de multa de até 20 salários-mínimos, mas não é o que tem ocorrido. O GLOBO entrou em contato com os dez conselhos da capital. Em oito, a informação foi a mesma: com raríssimas exceções, os relatos de bullying sempre chegam somente através dos pais. Um conselho não quis passar informações sobre as notificações e no outro, ninguém atendeu às ligações.
O delegado Fábio Corsino, titular da Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima (Dcav), também afirma que não tem sido informado pelos colégios.
— Seria importante que essas notificações chegassem; a escola tem a obrigação de agir. O bullying em si não é tipificado como um crime, mas pode haver uma série de delitos envolvidos nessa prática, como lesão corporal ou constrangimento ilegal. O ideal é que possamos fazer uma avaliação caso a caso — diz Corsino, ressaltando que a unidade conta com profissionais de apoio, como psicólogos.
Apesar de a lei estar em vigor há mais de seis meses, o deputado autor do texto, André Corrêa (PPS), atual líder do governo na Alerj, admite que a regra não vingou. Até agora, segundo o parlamentar, nenhuma escola foi multada:
O bullying não é novidade nas escolas, mas a discussão em torno do problema voltou à tona nos últimos dias após a divulgação de relatos em que Wellington Menezes de Oliveira, responsável pelo massacre na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, utiliza agressões sofridas no colégio como uma das justificativas para a carnificina. Autor do livro “Manual antibullying”, o psiquiatra Gustavo Teixeira afirma que, isoladamente, a prática não pode ser considerada responsável pela tragédia:
— O bullying pode ter sido um dos gatilhos, mas para uma pessoa que já tinha uma doença psiquiátrica. O que pode ter ocorrido é que a prática acabou fazendo com que aquela loucura fosse ambientada na escola, como ocorreu.
Fonte: Jornal Extra
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