segunda-feira, 26 de junho de 2017

Redenção

PANORAMA

Ricardo (um senhor de seus 60 anos, mais ou menos), taxista carioca, nascido, criado e estabelecido a vida inteira no Rio de Janeiro, nunca visitou o Cristo Redentor. Claro que não foi por falta de oportunidade, e ele até sobe o morro do Corcovado para fazer caminhadas em meio a trilhas da floresta que circunda este local, um dos mais bonitos do Rio de Janeiro.

Acontece que ele não tem o menor interesse em compartilhar fotos num dos pontos turísticos favoritos da maioria das pessoas que visitam a cidade maravilhosa.
Por obrigação do ofício, está acostumado a transportar passageiros do mundo todo, o tempo inteiro, de um lado para outro da cidade. Apesar disso confessa não ter vontade de frequentar alguns lugares do Rio de Janeiro, considerados verdadeiras maravilhas pelos turistas.
Para ele, tanto faz, embora isso gere muito espanto e uma curiosidade, especialmente diante de uma sociedade que cobra e obriga, compulsoriamente, as pessoas a “conhecer” e a “saber” tudo.
– Como assim nunca foi lá? Tão pertinho?
– Não gosta de viajar? Que estranho!
– Você tem que conhecer. Não sabe o que está perdendo.
– Como que eu não vi suas fotos no face?
E por aí vai…
Indagações como essas seriam naturais se não fossem constrangedoras, na maioria das vezes, causando um desconforto a quem simplesmente leva a vida do jeito que lhe convém, independentemente da opinião de quem se dedica a bisbilhotar a vida alheia, negligenciando a sua própria, talvez.

A história do taxista que nunca foi ao Cristo Redentor, mas que já viajou mais de uma vez para a Europa, (caso alguém se interesse em saber) reflete um comportamento que tem se multiplicado assustadoramente. No trabalho, na rua, nos supermercados, nas redes sociais, em qualquer lugar, a abordagem, o bullying, o desrespeito e a intolerância com o que difere do “senso comum” ou do que o cidadão “julga” correto tem gerado atitudes pedantes, até entre os iguais.
Indiferente, na sua “carioquice” da gema, o taxista resgata em mim a tranquilidade de ser o que se é, levando a vida que se quer, sem a obrigatoriedade de nada. Em meio a um pequeno engarrafamento que me deixa impaciente no curto trajeto do centro até o hotel, Ricardo sorri e diz: – Calma. Aproveita o percurso.
Em paz com a vida, embalado pela música suave do rádio, ele seguia falando tranquilamente das belezas do Rio de Janeiro, do Rio Grande do Sul da Europa, do mundo. Em meio ao trânsito caótico daquele horário, aprendi mais uma lição, sem me importar com o taxímetro que pareceu travar junto com o tempo.

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