terça-feira, 16 de abril de 2013

Vítima de Bullying conta trajetória de agressões que culminou com ameaças de ataques ao Motiva e falso sequestro


Nas horas vagas, Rafael é produtor musical e idealiza programas para computadoresNas horas vagas, Rafael é produtor musical e idealiza programas para computadores
Rafael Fonseca Sinfrônio tem 23 anos e cursa veterinária na Universidade Federal de Campina Grande, em Patos. Nas horas vagas é produtor musical e se comunica via web com jovens de outros países, com quem projeta softwares para computadores. É um rapaz de classe média, simpático e tem bom trato social. Aparentemente, um paraibano tranquilo, parodiando Graham Greene e o seu livro o ‘Americano Tranquilo’, onde ninguém é o que parece ser.

Fonseca tem um passado no mínimo inquietante. Em 2007 ele foi manchete na TV, e nos portais de João Pessoa, como um jovem que fazia ameaças anônimas de ataque ao colégio Motiva da capital. Nas ameaças, Rafael aparecia num vídeo encapuzado e empunhando uma arma. Em 2008, o rapaz simulou um falso sequestro cujo fim seria a sua própria morte, onde seria queimado vivo com os pés e mãos algemadas. Tudo isso para chamar atenção contra o Bullying que sofria desde os 11 anos de idade. 

Para entender a história de Rafael é preciso voltar mais no tempo para o ano de 2002 quando ele estudava no Colégio PIO XI.

O Bullying - Afogado na Piscina e Trauma de Morcego

Tudo começou após uma situação aparentemente prosaica. Numa semana de provas, a professora de inglês resolveu passar exercícios (considerados por Rafael) demasiados. O garoto que tinha entre 11 e 12 anos, reclamou, pedindo para que os exercícios fossem diminuídos e recebeu de volta uma brincadeira em forma de chacota da professora que o acusou de estar fazendo corpo mole.

“Eu relatei o fato à coordenação, que chamou a professora”, explica Fonseca. De volta à sala de aula, a professora fez questão de chamar a atenção de Rafael no meio de todo mundo, diminuiu o prazo de entrega e o responsabilizou pelo motivo.

No mesmo dia, ainda no PIO XI, seis alunos fizeram a ‘rodinha do bobo’, na parte mais atrás do colégio. Na segunda vez foi mais grave, foi na piscina do colégio. “Todo mundo saiu. Eu fiquei na piscina e tentei sair. Aí eles tentaram me afogar. Eu queria sair e levava chute para cair de volta na piscina. Fiquei meia hora sem poder sair e sem poder segurar na borda porque eles pisavam nos dedos”, lembra.

Em outro momento prenderam Rafael dentro de um depósito. “Eu nunca vi tanto morcego na minha vida”. Foram quase duas horas, abaixado e em silêncio, com medo. “Hoje em dia eu ainda tenho esse trauma de morcego, e tento me livrar dele”, conta. 

Ameaças ao Motiva – O Pós-Bullying

Imagens das ameças feitas por Rafael no OrkutImagens das ameças feitas por Rafael no Orkut
Tudo isso veio explodir num outro colégio, o Motiva. “No Motiva eu não sofri aquele Bullying hollywoodiano que mostra na televisão. Eles me apelidaram de Chupeta de Baleia. Mas eu fingia ao máximo não me importar, para não acontecer o que aconteceu no PIO XI”. O apelido era uma referência ao cabelo liso e cortado em formato de cuia que Rafael usava.

Nessa época, entre os 15 e 17 anos, Fonseca vivia sobre efeito de drogas pesadas – remédio tarja preta, conseguidos via internet, que lhe deixavam mais calmo, mas ao mesmo tempo lhe ‘apagavam’ a fronteira do perigo. Com o passar dos anos, a raiva e o desejo de vingança foi aumentando e ele resolveu que não sairia do Motiva sem antes chamar a atenção para o Bullying. Foi aí que ele planejou o ataque ao colégio.

“Primeiro comecei por carta, depois e-mails e telefone”, conta. Nas cartas e e-mails, Fonseca pressionava o colégio a fazer alguma coisa para combater o Bullying. Sem uma resposta eficaz, Fonseca partiu para ameaças mais drásticas. Era 2007.

Rafael Fonseca durante entrevista exclusiva ao portal paraibaRafael Fonseca durante entrevista exclusiva ao portal paraiba
Ele pegou fotos onde aparecia armado e encapuzado e divulgou na comunidade do Motiva se intitulando Grupo Bulicida. Desse dia em diante a história tomou outro rumo, o caso saiu nos portais e na televisão. A repercussão foi imediata. Com as ameaças, colocaram mais de 28 seguranças dentro do Colégio, tinha policial a paisana e até detector de metal nas portas.

Se entregou – Rafael não tinha a intenção de fazer um ataque e acabou se entregando. Na confusão gerada pelas drogas, o desejo inicial dele era simular uma agressão e tentar puxar a arma de um policial e se matar. Mas ele não seguiu o plano. Depois de se entregar ele começou um tratamento com uma psicóloga orientada pela promotoria da infância. O tratamento durou cerca de seis meses.

Falso Sequestro - ‘Tomei banho de gasolina e fiquei esperando para tomar coragem de acender o fósforo’

Em janeiro e fevereiro de 2008, a Polícia ainda tinha algumas dúvidas se Rafael tinha inventado o Grupo Bulicida ou ele existia de fato. Aliado a isso, Fonseca começou a achar que o foco de tudo que tinha acontecido estava muito nele. Tinham esquecido o motivo principal: o Bullying. “Eu não queria ficar como um criminoso. Parecia que eu tinha feito uma brincadeira de mau gosto”, conta. Foi então que ele criou outra situação para desviar o foco.

Rafael foi em direção ao Altiplano Cabo Branco, bairro nobre de João Pessoa, e se encharcou de gasolina. “Me algemei, pernas e mãos. Primeiro algemei os pés, depois coloquei os capuz e por último algemei as mãos e fiquei esperando para tomar coragem para acender o fósforo. Fiquei aguardando, aguardando...”

Fonseca tinha entrado mata adentro, estava longe do movimento dos carros e das pessoas. Enquanto tomava coragem para acender o fósforo começou a sentir as queimaduras da gasolina. Ficou tonto com o cheiro que exalava do capuz, da roupa e do corpo embebidos com o combustível. “Ficou insuportável respirar. Me desesperei e sai me arrastando. Perto de uma cerca, comecei a gritar por socorro e acabou chegando um policial a paisana que estava embaixo da barreira do Altiplano”, lembra. Rafael disse que tinha sido sequestrado. Passado o susto, na delegacia, depois de um interrogatório que durou cerca de oito horas, Rafael admitiu novamente a verdade.

Pensamento Suicida – Fonseca ainda tentou se matar mais uma vez, agora depois do interrogatório, quando ele tomou uma overdose. “Depois do depoimento, cheguei numa situação terrível. Peguei todos os medicamentos que eu tinha... era a última ação que eu ia tomar...”. A família agiu rápido e ele foi levado para Unimed. Lá Fonseca passou por uma semana de desintoxicação. Foi com o tratamento na Unimed, e trabalhando na promotoria da infância ao lado dos promotores Arley e Soraya Escorel que Rafael conseguiu sair do fundo do poço.

Imagem da emeça feita por Rafael ao MotivaImagem da emeça feita por Rafael ao Motiva
Rafael Fonseca conta que olhando para trás, se arrepende do que aconteceu. “Eu acabei piorando mais ainda a minha situação, foi essa ausência de medo... juntou tudo... Algo que eu me arrependo hoje em dia, obviamente. Mas naquela época, sem visão de futuro eu fazia tudo para me afetar, era o que eu queria, sumir”, admite.

Projeto contra Bullying – O vereador Zezinho do Botafogo (PSB) conseguiu aprovar na Câmara de João Pessoa a Lei Rafael Sinfrônio, projeto que autoriza a criação do programa de combate ao bullying nas escolas municipais da capital. De acordo com o projeto, a escola é responsável pela criação de um plano de ações para a implantação das medidas previstas no programa, podendo encaminhar vítimas e agressores aos serviços de assistência médica, social, psicológica e jurídica, que poderão ser oferecidos por meio de parcerias e convênios. 

Pode-se dizer que foi também graças a Rafael que a promotoria da infância da Paraíba conseguiu que nacionalmente as denúncias contra Bullying pudessem ser feitas através do Disque 100. Outra medida tomada a partir do caso de Rafael, é que passaram a ser admitidas medidas sócio-educativas para menores infratores.

O Crime – A única acusação formal feita contra Rafael foi por "falsa comunicação de crime", devido ao falso sequestro. Como ‘pena’, foi determinado que haveria um período de trabalho comunitário. Rafael deveria prestar trabalhos no MP, junto a promotoria da infância.
Segundo Rafael, não houve um enquadramento no crime de ameaças ao Motiva, pois não foi caracterizado uma ameaça específica a alguém nos vídeos.

Rafael hoje estuda veterinária na UFCGRafael hoje estuda veterinária na UFCG
Trabalho de Ajuda – Rafael mantém no youtube um canal onde ele alerta sobre o Bullying. Fonseca também tenta ajudar todos os que lhe abordam para saber sobre o que fazer em casos de Bullying. O canal no youtube já chegou a receber mais de 50 mil visitas desde que foi criado. Rafael também conta que todas as pessoas do seu círculo atual sabem de sua história e inclusive brincam com ele, o chamando de ‘homem bomba!’



Veja abaixo vídeo de  Rafael Fonseca explicando o que é Bullying e como as vítimas do bullying podem ser ajudadas: CLIQUE AQUI



Fonte: Paraíba

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