“Betinho, totó, atrasado mental”. Dois amigos vêem, no primeiro dia de aulas, um rapaz a chamar nomes a outro. “O que é fazemos?”, pergunta a rapariga, ele responde “vamos embora daqui”, ela decide agir e diz-lhe “pára com isso” e o agressor deixa de chamar nomes ao menino e vai-se embora. “Nível 1 completo”. O jogo Stopbully foi concebido para ser jogado por crianças dos 10 aos 12 anos, tendo como objectivo aumentar a empatia com as vítimas, tentando mudar o comportamento dos que observam e nada fazem, explica Susana Carvalhosa, professora do Departamento de Psicologia Social e das Organizações, do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), em Lisboa.
O alvo deste chamado “jogo sério”, porque tem uma intenção pedagógica, não são tanto os agressores nem as vítimas, são a maioria das crianças envolvidas no bullying, as que com o seu comportamento de passividade, às vezes de incitamento, perpetuam e reforçam o comportamento do agressor, explica. Na Internet (cyberbullying) o observador é, por exemplo, a criança ou o jovem que faz um “gosto”, que reencaminha ou comenta um vídeo violento ou insultuoso. “O correcto seria reportar a mensagem como incorrecta e não reencaminhar. Não fazer nada, partilhar, reforça o comportamento do agressor.”, nota Susana Carvalhosa.
É esse tipo de comportamento, a capacidade de dizer que “não” e ir contra os seus pares, que este jogo pretende promover. “Os dados dizem-nos que o pico [do bullying] acontece aos 13 anos, é preciso actuar preventivamente”, sublinha.
Neste jogo, que existe apenas em protótipo e aguarda financiamento para ser produzido, os prémios por passar de nível traduzem-se em aumento do número de amigos e de convites. É um projecto do ISCTE, desenvolvido tecnologicamente pela Faculdade de Ciências de Engenharia Informática, da Universidade de Lisboa.
A investigadora diz que a intenção é que o jogo possa vir a ser disponibilizadoonline e que seja usado nas escolas, como complemento das acções de prevenção de bullying, “em vez de serem só expositivas". "As situações do jogo podem ser debatidas em sala de aulas”, nota.
O jogo tem também uma funcionalidade que permite o registo das opções feitas pelos jogadores, e que pode ser usado como ferramenta para profissionais de saúde mental. A criança joga em casa e depois pode-se discutir em consultório, refere a investigadora do Centro de Investigação e Intervenção Social, Maria de Jesus Candeias, que também é autora do projecto e está a testar o jogo numa escola de Odivelas.
A ideia é criar outro jogo mas este para os pais. Vai estar disponível no próximo ano e terá seis cenários com situacões de risco nas redes sociais, podendo estes escolher as opções mais adequadas e receber pontuação.
“A ideia é que os pais façam uma aprendizagem interactiva sobre a privacidade, o processamento de dados e o uso de recursos de ajuda". O jogo faz parte de um projecto europeu, Parents&Nets, que existirá em várias línguas e incluirá um guia para pais, que apresentará os sites mais populares e as redes sociais utilizadas pelos jovens, expondo os pontos fortes e os riscos de cada um deles e mostrando como evitá-los, explica o site do projecto.
O que se constata, nota Susana Carvalhosa, “é que os pais têm poucos conhecimentos sobre o que podem fazer, alguns não usam as redes sociais, não conversam com os filhos sobre o uso da Internet, não sabem as diferentes tecnologias que estes usam e não se sentem confiantes no seu uso". Então “os estilos parentais” podem variar entre a proibição completa, “quando sabemos que na net há muitas oportunidades”, diz Susana Carvalhosa, e a permissividade. O que se pretende é que “os pais controlem, acompanhem os usos da Internet dos seus filhos, dando-lhes autonomia a e responsabilidade.”
Conselhos para os pais:
Susana Carvalhosa, professora do Departamento de Psicologia Social e das Organizações, do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, em Lisboa, investigadora na área do bullying e cyberbullying, diz que há algumas coisas que os pais podem fazer.
1-À medida da idade da criança, ir dando alguma autonomia na escolha e nas decisões, porque nalguns casos as vitimas vêm de famílias super-protectoras que, quando saem do seio familiar e entram pela primeira vez na escola não sabem tomar decisões, não sabem interagir adequadamente com os outros e geram-se problemas.
2-A nível mais pessoal, ensinar competências sociais, como saber iniciar uma conversa, saber ouvir a opinião dos outros, saber olhar nos olhos quando estamos a estabelecer uma conversa. Algumas crianças não conseguem olhar de frente para os outros e quando são abordadas por outro estão a olhar para o chão. Isto é um sinal que é dado ao agressor de que está aqui “um mais fraco” ou “envergonhado” e, portanto, é um alvo fácil. Esta questão de conseguir estabelecer contacto visual é uma pista que é trabalhada com as crianças a quem isto acontece e que às vezes exige treino.
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