terça-feira, 13 de setembro de 2016

Rosely Sayão: "A instituição de ensino não sabe lidar com conflitos. Por isso, muitas vezes, não quer alunos questionadores"


Em novo livro, "Educação Sem Blá-Blá-Blá", a psicóloga Rosely Sayão fala, entre diversos assuntos, sobre o papel da escola e da família na rotina das crianças

Por Fernanda Montano

Professora lendo aos alunos (Foto: Skynesher/Getty Images)
Educar não é tarefa fácil, mas é também uma das coisas mais importantes que podemos fazer na vida. Afinal, é o legado que deixaremos para as gerações futuras. Para isso, devemos contar sempre com a escola. Um dos principais nomes quando o assunto é educação, a psicóloga Rosely Sayão fala sobre isso em seu novo livro, Educação Sem Blá-Blá-Blá. A obra traz as principais colunas da autora publicadas no jornal Folha de S. Paulo, que abordam temas como diversidade, a importância de dizer não, linhas pedagógicas, datas comemorativas nas escolas, lição de casa, bullying, consumismo e política em sala de aula. A seguir, confira a entrevista que Rosely concedeu à CRESCER.
No livro, você diz que o filho tem a oportunidade de ser outro quando está na escola. Longe das expectativas dos pais, se sente mais livre para experimentar novas maneiras de ser e se relacionar com o mundo. Seria na escola, então, que ele vai formar sua própria opinião, ter liberdade para debater, ser crítico?
Isso depende, primeiramente, da maturidade, de usar o conhecimento que tem para criar. Mas a escola não tem estimulado, pois a primeira vítima é ela mesma e não mostra interesse nisso. A intituição de ensino não sabe lidar com conflitos. Por isso, muitas vezes, não quer alunos questionadores. Melhor aprender quieto mesmo.
E qual a solução para isso?
A primeira coisa é as famílias aceitarem que a escola vai criar o filho de um jeito diferente do que acontece em casa. A função da instituição de ensino é colocar o aluno no trajeto do pensamento científico e do conhecimento, para que ele consiga mais tarde fazer suas escolhas. Mas parece que as famílias não querem. Elas precisam aceitar que o filho não é cópia delas. Muitos pais dizem: “Vou procurar uma escola que fale a mesma linguagem que nós”. Eu diria não, faça exatamente o contrário, procure uma escola em que a criança tenha contato com coisas diferentes das que já têm em casa.
Educação sem blá-blá-blá - Como preparar seus filhos e alunos para o convívio familiar, a escola e a vida, de Rosely Sayão, Editora Três Estrelas, R$ 49,90 (Foto: Divulgação)
Como a escola deve lidar com questões atuais, como identidade de gênero, machismo/feminismo?
A escola tem que estar ao lado do aluno. Em uma instituição que conheço, as meninas queriam jogar futebol, mas os meninos tomaram conta da quadra. Houve toda uma discussão de por que não jogar juntos. Foi uma observação atenta da escola, que poderia, por exemplo, ter separado os horários, mas aí os alunos não aprenderiam nada.
Quando se preocupar com o vestibular? Você diz no livro que, em nome da preparação para o futuro, as escolas empobrecem a infância.
As famílias não deveriam ter preocupação nenhuma com o vestibular, que nada mais é do que fazer certo tipo de prova. Se a escola ensina o aluno a pensar, estimula a ter força para seguir, conquistar pensamento crítico, certamente ele saberá dar conta do vestibular.
Qual o papel da escola em casos de bullying?
Não gosto da maneira como isso se tornou “o outro é sempre uma grande ameaça para mim”. Se a escola efetivamente cumprisse seu papel, esses casos seriam daqueles corriqueiros que as crianças resolveriam entre si. Mas como a instituição de ensino está ausente e preocupada só com conteúdo, não ensina as crianças a se relacionar.
Como a escola deve lidar com os transtornos de aprendizagem?
A escola ficou muito defasada, se interessa pela normalidade e massificação. Quando tem um aluno que foge do perfil de ficar quieto e fazer o que manda, a instituição normalmente é a primeira a chamar os pais e pedir encaminhamento. Costumamos dizer que tem um monte de “urubus” rondando as escolas: profissionais como psicólogos, fonoaudiólogos e psiquiatras só esperando essas crianças. O papel da escola é entender e não colaborar com esses diagnósticos precoces.

Nenhum comentário:

Postar um comentário