Aos 25 anos, a britânica Harnaam Kaur detém o recorde mundial de mulher mais jovem a exibir uma barba farta, que durante anos lhe rendeu episódios de bullying. Depois de superar os ataques, ela agora se orgulha da aparência que tem e atua como ativista do resgate da autoestima
Em tempos de valorização da beleza real, a britânica Harnaam Kaur ganha as redes como referência absoluta. Aos 16 anos, uma síndrome de ovário policístico estimulou o crescimento de uma barba farta, que ela não esconde, prefere exibi-la com muito orgulho. Os pelos faciais fazem parte de seu estilo pessoal, tanto quanto seu turbante azul poderoso e delineado impecável.
Mas a autoaceitação não veio fácil. Kaur precisou enfrentar anos de ataques preconceituosos, durante a infância, até se transformar em uma poderosa ativista e referência de autoestima, assim como estrela do Instagram. Seu objetivo é combater os estereótipos de gênero e qualquer padrão de beleza socialmente estabelecido.
Agora, aos 25 anos, ela entrou para o Guinness Book como a mulher mais jovem a carregar uma barba cheia e encara com bom humor as reações de desconhecidos na rua. “Desde que minha história veio à tona, algumas pessoas chegam a me reconhecer, mas quando não, costumam fazer cara de espanto. Acho engraçado. Elas olham para os meus olhos... Então para a minha barba... E depois para os meus seios”, contou ao jornal The Guardian. Só não tolera abusos verbais ou fotos sem autorização.
Tal postura, no entanto, foi duramente conquistada. Na infância, possuía uma autoestima bastante frágil por ser uma menina gorda, negra e cuja puberdade se deu aos 10 anos de idade. “Fui chamada de ‘homem’, ‘leão’, ‘ogro’, ‘gorda’”, conta. Enquanto criança tímida, ela não conseguia enfrentar as agressões.
Nervosa com a possibilidade de a filha continuar sendo destratada socialmente, a mãe de Kaur decidiu levá-la a um salão de beleza. “Foi horrível”, relata. “A cera sendo colocada, depois o papel e então o puxão... Eu gritei tão alto que uma mulher que fazia o cabelo do outro lado da porta jogou longe a revista que tinha em mãos. Eu não parava de chorar. Repeti isso por vários dias, porque meus pelos cresciam muito rápido. E entre uma depilação e outra, ainda raspava o que ia crescendo. Eles repetiam o procedimento até minha pele queimar.”
Em vez de cessar o bullying, as depilações só contribuíam para que Kaur alimentasse uma enorme vergonha de sua aparência. “Já chegaram a me ameaçar com faca, me tocarem com o pênis”, conta. Aos 15 anos, ela passou a faltar nas aulas, considerar o suicídio e a se machucar. “Eu queria punir meu corpo por ser desse jeito. Queria machucá-lo.”
Até que um dia ela esvaziou um pote de remédios em sua mão. “Foi a virada”, conta. “Pensei, ‘Dane-se!’. Se quem pratica bullying está vivendo, por que eu não deveria viver?”
Desde então, ela trocou o salão de beleza por brincadeiras no parque com o irmão e ainda agregou ao seu estilo um turbante, que funciona como um símbolo de sua força e uma maneira de projetar sua identidade com orgulho.
Apesar de ter recuperado sua autoestima, ela ainda sofre pressão para retirar a barba e o bigode. “As pessoas me dizem: ‘Você parece um homem’. Você não vai conseguir casar ou trabalhar”, conta. Ela resiste.
Como ativista do resgate da autoestima e antibullying, ela acredita que a sociedade pode ser “curada pelo empoderamento, por mulheres fortes”. Por isso usa as redes sociais para alcançar pessoas como ela. “Uma a cada cinco mulheres tem ovário policístico e muitas se aproximam de mim para saber como combater o bullying e aceitar a si mesmas”, diz. “Eu quero que elas pensem que, se eu estou na passarela [ela desfilou recentemente para uma marca de joias], elas também podem. Quero quebrar o molde.”
Sua visibilidade nos meios de comunicação tem a transformado em uma espécie de imã de fetichistas também. “Eu dou risada, apago e logo bloqueio”, diz. “Não passei por tudo isso para me tornar objeto de ninguém. Tem muita gente rasa por ai, então acho que preciso de um homem ou mulher forte para que realmente me diga o quer comigo.”
Kaur também se posiciona contra a ideia de que são os órgãos genitais que nos definem. “Eu não acredito no gênero. Quem foi que disse que vagina é de mulher e pênis é de homem, ou que rosa é para meninas e azul para meninos? Estou sentada aqui com uma vagina, dois seios e uma bela barba. Vivo pela frase ‘meu corpo, minhas regras’.”
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