quinta-feira, 5 de novembro de 2015

As quotas para mulheres continuam a ser uma necessidade

Debate sobre direitos e igualdade de género juntou deputadas, juíza e socióloga.

As quotas que fazem com que 35% do Parlamento português seja feminino continuam a ser necessárias para que as mulheres tenham acesso ao poder? Isabel Moreira e Teresa Leal Coelho, embora estejam sentadas em bancadas diferentes, a primeira na do PS e a segunda na do PSD, concordam: sim. A ante-estreia do filme As sufragistas foi o mote para convidar quatro mulheres – duas deputadas, uma socióloga e uma juíza conselheira – para falar sobre direitos e igualdade de género, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, na noite de terça-feira.

“Se fossem suspensas [as quotas], o número de mulheres diminuiria no Parlamento”, responde Teresa Leal Coelho que reconhece que os partidos, quando elaboram as listas, "estão abertos a tratar melhor as mulheres". “Gostava de suspender as quotas, por um bocadinho, só para ver como os partidos se comportariam… Estou convencido de que regrediríamos”, diz, por seu lado, Isabel Moreira.

Também Maria Clara Sottomayor, juíza conselheira do Supremo Tribunal de Justiça, concorda que embora as mulheres possam chegar aos lugares de poder ou ao topo da carreira por mérito, as quotas são necessárias. Aliás, sem elas “diminuiria imediatamente o número de mulheres deputadas”, prevê.

“Sem quotas as coisas não avançam”, é peremptória Anália Torres, socióloga e coordenadora do Centro Interdisciplinar de Estudos de Género, do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, que dá um exemplo concreto, o da constituição da equipa reitoral resultante da fusão da Universidade de Lisboa com a Universidade Técnica de Lisboa: todos homens. Tal aconteceu porque as mulheres não se movimentam nos mesmos corredores, reflecte. “Há redes de interconhecimento, as coisas aparecem como naturais para os homens, e estas redes não são mistas”, justifica a socióloga. “Os lugares de poder são escassos” e, por isso, são distribuídos pelos que “são próximos”, acrescenta ainda. Mas nada disto se faz por conspiração – “os homens não se põem num canto a conspirar contra as mulheres. As coisas aparecem-lhes como naturais e, por isso, nomeiam-se uns aos outros”, continua a investigadora. Acontece porque é o funcionamento da sociedade, mas esse “tem de ser quebrado” e as quotas “quebram essas redes naturais”. “A questão da igualdade tem de estar nas cabeças dos homens”, declara.

Teresa Leal Coelho lembra a iniciativa da anterior secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade e agora ministra da Cultura, Igualdade e Cidadania, Teresa Morais, quando em Junho deste ano assinou um compromisso com 13 empresas para promover a igualdade de género nas administrações. Em declarações à TSF, a ministra que também esteve presente na sessão defendeu que o caminho pelos direitos das mulheres ainda "é feito de pedra" porque ainda há "muita resistência"

Para Isabel Moreira é importante que as mulheres estejam no topo das empresas, “mas é muito mais importante a aposta no Estado Social”. “Enquanto feminista, a grande condição de libertação das mulheres é o Estado Social”, afirma, lembrando que falta ainda muito para que a igualdade de géneros seja efectiva, dando como exemplo o impedimento de uma mulher solteira submeter-se a tratamentos de procriação medicamente assistida porque “não tem um homem”. “Se estamos a falar de uma questao que liberta a mulher da tutela de um homem, não entendo porque o Estado é bipolar”, confessa, arrebatando uma salva de palmas da plateia. Embalada pelo apoio sentido, a deputada socialista fala da luta LGBT e evoca ainda as alterações à lei da interrupção voluntária da gravidez para dizer que faz o Estado campanhas contra o bullying, mas é o próprio Estado que “faz bullyingquando diz que não podes casar, não podes adoptar” e fica à espera do consenso social para decidir.

"Persistência de desigualdade"
A Assembleia da República trata bem as mulheres deputadas, pergunta Maria Flor Pedroso, jornalista da Antena 1 e moderadora da mesa. Nem por isso, afinal “o Parlamento é um lugar reflexo da sociedade em que vivemos” e continua a ser “patriarcal”, responde Isabel Moreira, dando um exemplo: “um homem se é contundente, é efusivo; uma mulher se é contundente, é histérica”. É mais difícil ser levado a sério quando se é do sexo feminino, confessa.

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