Por Cláudio Isaías
As agressões físicas e psicológicas a crianças e jovens feitas por colegas são uma realidade cada vez mais frequente e preocupante nas escolas públicas e particulares do País. As tradicionais brincadeiras estão dando lugar ao preconceito, à violência e à covardia entre os estudantes. Para a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, autora do livro Bullying – Mentes Perigosas nas Escolas, o bullying não pode ser mais tratado como um fenômeno da área educacional. “Atualmente ele já é definido como um problema de saúde pública e, por isso mesmo, deve entrar na pauta de todos os profissionais que atuam na área médica, psicológica e assistencial de forma mais abrangente”, comenta.
De acordo com Ana Beatriz, a falta de conhecimento sobre a existência, o funcionamento e as conse-quências dessa violência propicia o aumento desordenado no número e na gravidade de novos casos. A psiquiatra lança amanhã o seu livro no talk show Conversa no Praia, promovido pela Praia de Belas Shopping e pela Saraiva MegaStore. O evento começa às 19h, no palco montado no primeiro piso do shopping.
Jornal do Comércio – Quais as principais características de quem pratica o bullying?
Ana Beatriz Barbosa Silva – Na escola, os bullies (agressores) fazem brincadeiras de mau gosto, gozações, colocam apelidos pejorativos, difamam, ameaçam, constrangem e menosprezam alguns alunos. Perturbam e intimidam por meio de violência física ou psicológica. Furtam ou roubam dinheiro, lanches e pertences de outros estudantes. Costumam ser populares na escola e estão sempre enturmados. Divertem-se à custa do sofrimento alheio. No ambiente doméstico, mantêm atitudes desafiadoras e agressivas em relação aos familiares. São arrogantes no agir, falar e se vestir, demonstrando superioridade. Manipulam pessoas para se safar das confusões em que se envolveram. Costumam voltar da escola com objetos ou dinheiro que não possuíam. Muitos agressores mentem, de forma convincente, e negam as reclamações da escola, dos irmãos ou dos empregados domésticos.
JC – Em que faixa etária se encontram as vítimas. Qual é o perfil das crianças agredidas?
Ana Beatriz – As vítimas de bullying normalmente são crianças e adolescentes. Encontramos também jovens adultos no Ensino Médio ou nas universidades. No caso dos trotes violentos, por exemplo, quando são casos isolados, não são classificados como bullying, mas como uma variante dele. No entanto, a partir do momento em que o calouro passa a ser perseguido com frequência por um ou mais veteranos, humilhado, zombado, ameaçado etc, já podemos pensar em bullying dentro do ambiente universitário. Quanto ao perfil, os bullies escolhem os alunos que estão em franca desigualdade de poder, seja por uma questão socioeconômica, de idade, de porte físico ou até porque numericamente estão desfavoráveis. Além disso, as vítimas, de forma geral, já apresentam algo que destoa do grupo – são tímidas, introspectivas, nerds, muito magras, de credo, raça ou orientação sexual diferentes. Este fato por si só já as torna pessoas com baixa autoestima e, portanto, são mais vulneráveis aos agressores. Não há justificativas plausíveis para a escolha, mas certamente os alvos são aqueles que não conseguem fazer frente às agressões sofridas. É um ato covarde.
JC – Como professores, pais e vítimas podem resolver este problema?
Ana Beatriz – É dever de todos intervir e tentar fazer algo para mudar esse panorama sombrio, caso contrário chegaremos ao caos absoluto. No entanto, nunca devemos agir sozinhos, mas através de um grupo de pessoas, com a união de pais, instituições de ensino e toda a sociedade. Nossos jovens necessitam de que profundas transformações ocorram tanto no ambiente familiar quanto no escolar. É preciso buscar alternativas nas avaliações dos alunos além de provas e testes acadêmicos tradicionais. A escola deve ser um ambiente que valorize mais as relações interpessoais, que são fundamentais para o amadurecimento adequado desses jovens. Ela deve adotar políticas e ações contra o bullying e premiar os alunos que tenham posturas éticas e solidárias.
JC – Por que jovens têm necessidade de praticar o bullying?
Ana Beatriz – O bullying sempre existiu em todas as escolas do mundo, tanto públicas quanto privadas. Mas somente a partir das décadas de 1970 e 1980 começou a ser estudado, em função da proporção gigantesca que vem alcançando. O individualismo, cultura dos nossos tempos modernos, contribuiu muito para que chegássemos nesse descontrole de desrespeito ao próximo.
JC – É uma doença? Tem cura? Existe tratamento?
Ana Beatriz – Bullying não é uma doença, mas sim um fenômeno caracterizado por atitudes agressivas ocorridas em instituições escolares. Portanto, não podemos falar em tratamento, nem cura, mas sim em prevenção e atitudes proativas. A palavra bullying ainda é pouco conhecida do grande público. De origem inglesa e sem tradução ainda no Brasil é utilizada para qualificar comportamentos agressivos no âmbito escolar, praticados tanto por meninos quanto por meninas. Os atos de violência (física ou não) ocorrem de forma intencional e repetitiva contra um ou mais alunos que se encontram impossibilitados de fazer frente às agressões sofridas. Tais comportamentos não apresentam motivações específicas ou justificáveis. Em última instância significa dizer que, de forma “natural”, os mais fortes utilizam os mais frágeis como meros objetos de diversão, prazer e poder com o intuito de maltratar, intimidar, humilhar e amedrontar.
JC – As vítimas ficam com alguma sequela psicológica?
Ana Beatriz – As consequências são as mais variadas possíveis e dependem muito de cada indivíduo, da sua estrutura, vivências, pré-disposição genética, da forma e intensidade das agressões. No entanto, todas as vítimas, sem exceção, sofrem com os ataques de bullying. Muitas levarão marcas profundas provenientes das agressões para a vida adulta e necessitarão de apoio psiquiátrico ou psicológico para a superação do problema. Os problemas mais comuns que observo em consultório são desinteresse pela escola; problemas psicossomáticos; problemas psíquicos/comportamentais como transtorno do pânico, depressão, anorexia e bulimia, fobia escolar e social, ansiedade generalizada, entre outros. O bullying também pode agravar problemas preexistentes, devido ao tempo prolongado de estresse a que a vítima é submetida. Em casos mais graves, podemos observar quadros de esquizofrenia, homicídio e suicídio.
JC – O praticante de bullying é um psicopata ou será necessariamente?
Ana Beatriz – Não. Porém encontramos uma minoria que apresenta traços psicopáticos, que é perversa por natureza. São crianças ou adolescentes que apresentam a transgressão como base estrutural de suas personalidades. Eles não têm empatia com o próximo (colocar-se no lugar do outro), sentimento de amor, culpa ou compaixão. Esses jovens apresentam traços marcantes de psicopatia, que antes dos 18 anos são denominados transtorno da conduta. Desde muito cedo têm um prazer mórbido em ver o outro sofrer. Normalmente são os mentores do bullying, que recrutam seus “soldadinhos” para que sujem as mãos por eles.
JC – Os agressores chegam a se sentir culpados?
Ana Beatriz – A grande maioria, sim. E isso pode ser a curto, médio ou longo prazo. Depende muito do perfil do agressor. Quando ele está passando por dificuldades familiares, por exemplo (algo apenas circunstancial), certamente não se sentirá confortável com suas atitudes. Para aqueles que têm um padrão familiar de violência, ou modelos da “lei da esperteza”, que devem se impor através de comportamentos pouco éticos e solidários, a consciência ou o sentimento de culpa de que o desrespeito ultrapassou os limites pode demorar a surgir. Mas o quadro muda quando há alterações na postura familiar, social e escolar. Para aqueles que apresentam um perfil psicopático, infelizmente, não haverá nenhum sentimento de culpa ou compaixão. Ao contrário, sentem um prazer mórbido em ver o outro sofrer.
Fonte: Jornal do Comércio RS
De acordo com Ana Beatriz, a falta de conhecimento sobre a existência, o funcionamento e as conse-quências dessa violência propicia o aumento desordenado no número e na gravidade de novos casos. A psiquiatra lança amanhã o seu livro no talk show Conversa no Praia, promovido pela Praia de Belas Shopping e pela Saraiva MegaStore. O evento começa às 19h, no palco montado no primeiro piso do shopping.
Jornal do Comércio – Quais as principais características de quem pratica o bullying?
Ana Beatriz Barbosa Silva – Na escola, os bullies (agressores) fazem brincadeiras de mau gosto, gozações, colocam apelidos pejorativos, difamam, ameaçam, constrangem e menosprezam alguns alunos. Perturbam e intimidam por meio de violência física ou psicológica. Furtam ou roubam dinheiro, lanches e pertences de outros estudantes. Costumam ser populares na escola e estão sempre enturmados. Divertem-se à custa do sofrimento alheio. No ambiente doméstico, mantêm atitudes desafiadoras e agressivas em relação aos familiares. São arrogantes no agir, falar e se vestir, demonstrando superioridade. Manipulam pessoas para se safar das confusões em que se envolveram. Costumam voltar da escola com objetos ou dinheiro que não possuíam. Muitos agressores mentem, de forma convincente, e negam as reclamações da escola, dos irmãos ou dos empregados domésticos.
JC – Em que faixa etária se encontram as vítimas. Qual é o perfil das crianças agredidas?
Ana Beatriz – As vítimas de bullying normalmente são crianças e adolescentes. Encontramos também jovens adultos no Ensino Médio ou nas universidades. No caso dos trotes violentos, por exemplo, quando são casos isolados, não são classificados como bullying, mas como uma variante dele. No entanto, a partir do momento em que o calouro passa a ser perseguido com frequência por um ou mais veteranos, humilhado, zombado, ameaçado etc, já podemos pensar em bullying dentro do ambiente universitário. Quanto ao perfil, os bullies escolhem os alunos que estão em franca desigualdade de poder, seja por uma questão socioeconômica, de idade, de porte físico ou até porque numericamente estão desfavoráveis. Além disso, as vítimas, de forma geral, já apresentam algo que destoa do grupo – são tímidas, introspectivas, nerds, muito magras, de credo, raça ou orientação sexual diferentes. Este fato por si só já as torna pessoas com baixa autoestima e, portanto, são mais vulneráveis aos agressores. Não há justificativas plausíveis para a escolha, mas certamente os alvos são aqueles que não conseguem fazer frente às agressões sofridas. É um ato covarde.
JC – Como professores, pais e vítimas podem resolver este problema?
Ana Beatriz – É dever de todos intervir e tentar fazer algo para mudar esse panorama sombrio, caso contrário chegaremos ao caos absoluto. No entanto, nunca devemos agir sozinhos, mas através de um grupo de pessoas, com a união de pais, instituições de ensino e toda a sociedade. Nossos jovens necessitam de que profundas transformações ocorram tanto no ambiente familiar quanto no escolar. É preciso buscar alternativas nas avaliações dos alunos além de provas e testes acadêmicos tradicionais. A escola deve ser um ambiente que valorize mais as relações interpessoais, que são fundamentais para o amadurecimento adequado desses jovens. Ela deve adotar políticas e ações contra o bullying e premiar os alunos que tenham posturas éticas e solidárias.
JC – Por que jovens têm necessidade de praticar o bullying?
Ana Beatriz – O bullying sempre existiu em todas as escolas do mundo, tanto públicas quanto privadas. Mas somente a partir das décadas de 1970 e 1980 começou a ser estudado, em função da proporção gigantesca que vem alcançando. O individualismo, cultura dos nossos tempos modernos, contribuiu muito para que chegássemos nesse descontrole de desrespeito ao próximo.
JC – É uma doença? Tem cura? Existe tratamento?
Ana Beatriz – Bullying não é uma doença, mas sim um fenômeno caracterizado por atitudes agressivas ocorridas em instituições escolares. Portanto, não podemos falar em tratamento, nem cura, mas sim em prevenção e atitudes proativas. A palavra bullying ainda é pouco conhecida do grande público. De origem inglesa e sem tradução ainda no Brasil é utilizada para qualificar comportamentos agressivos no âmbito escolar, praticados tanto por meninos quanto por meninas. Os atos de violência (física ou não) ocorrem de forma intencional e repetitiva contra um ou mais alunos que se encontram impossibilitados de fazer frente às agressões sofridas. Tais comportamentos não apresentam motivações específicas ou justificáveis. Em última instância significa dizer que, de forma “natural”, os mais fortes utilizam os mais frágeis como meros objetos de diversão, prazer e poder com o intuito de maltratar, intimidar, humilhar e amedrontar.
JC – As vítimas ficam com alguma sequela psicológica?
Ana Beatriz – As consequências são as mais variadas possíveis e dependem muito de cada indivíduo, da sua estrutura, vivências, pré-disposição genética, da forma e intensidade das agressões. No entanto, todas as vítimas, sem exceção, sofrem com os ataques de bullying. Muitas levarão marcas profundas provenientes das agressões para a vida adulta e necessitarão de apoio psiquiátrico ou psicológico para a superação do problema. Os problemas mais comuns que observo em consultório são desinteresse pela escola; problemas psicossomáticos; problemas psíquicos/comportamentais como transtorno do pânico, depressão, anorexia e bulimia, fobia escolar e social, ansiedade generalizada, entre outros. O bullying também pode agravar problemas preexistentes, devido ao tempo prolongado de estresse a que a vítima é submetida. Em casos mais graves, podemos observar quadros de esquizofrenia, homicídio e suicídio.
JC – O praticante de bullying é um psicopata ou será necessariamente?
Ana Beatriz – Não. Porém encontramos uma minoria que apresenta traços psicopáticos, que é perversa por natureza. São crianças ou adolescentes que apresentam a transgressão como base estrutural de suas personalidades. Eles não têm empatia com o próximo (colocar-se no lugar do outro), sentimento de amor, culpa ou compaixão. Esses jovens apresentam traços marcantes de psicopatia, que antes dos 18 anos são denominados transtorno da conduta. Desde muito cedo têm um prazer mórbido em ver o outro sofrer. Normalmente são os mentores do bullying, que recrutam seus “soldadinhos” para que sujem as mãos por eles.
JC – Os agressores chegam a se sentir culpados?
Ana Beatriz – A grande maioria, sim. E isso pode ser a curto, médio ou longo prazo. Depende muito do perfil do agressor. Quando ele está passando por dificuldades familiares, por exemplo (algo apenas circunstancial), certamente não se sentirá confortável com suas atitudes. Para aqueles que têm um padrão familiar de violência, ou modelos da “lei da esperteza”, que devem se impor através de comportamentos pouco éticos e solidários, a consciência ou o sentimento de culpa de que o desrespeito ultrapassou os limites pode demorar a surgir. Mas o quadro muda quando há alterações na postura familiar, social e escolar. Para aqueles que apresentam um perfil psicopático, infelizmente, não haverá nenhum sentimento de culpa ou compaixão. Ao contrário, sentem um prazer mórbido em ver o outro sofrer.
Fonte: Jornal do Comércio RS
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