Essa pergunta tem me intrigado nos últimos dias. Estou me questionando sobre os gestos desastrosos que cometemos contra os outros. Podem ser palavras que nada dizem, mas provocam a dor física. Ou agressões que machucam o corpo e a alma. Dilaceram. Destroem a vida de quem é perseguido. São tão nocivos que podem até matar. Praticar bullying é tão rotineiro que nem percebemos. Ou fazemos conscientemente. Enfim. Quem nunca sofreu? Ou que nunca atirou a primeira pedra?
Talvez Caetano Veloso possa responder: “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”, canta a música Dom de Iludir. E esse verso corta lá dentro do peito. Descobri isso depois que publiquei a pergunta, que dá título a esse texto, no Facebook. Esperava depoimentos, textões ou palavras em monólogo como racismo, chacota, apelido, xenofobia. Contudo, recebi comentários emocionantes e surpreendentes. Pessoas que eu nunca imaginei que haviam sofrido algo no destino compartilharam suas experiências em comentários que me fizeram chorar. Coloquei-me em seus lugares para entender que, realmente, cada indivíduo sabe da própria vida. Como eu também sei dos bullyings que sofro, e já sofri.
Gordinhos, gays, idosos, nerds, mulheres, magrelos, altos, anões, negros, albinos, ruivos, deficientes visuais, os que perderam membros do corpo, os homens que gostam de dança, famosos, os que nasceram na zona rural, anônimos, pobres, os que possuem nomes incomuns, tímidos, estabanados, bagunceiros, quem tem muita grana no banco, machos, os que não gostam de futebol, as loiras gostosas, os que vivem em silêncio, beatas, fanáticos, os que escolhem o vermelho como cor predileta. Todos dividiram suas dores. Inclusive, quem agia do outro lado. Carlin publicou: “Eu era o cara que fazia… Sem noção dos malefícios que causava. Hoje me arrependo profundamente. E já pedi desculpas a alguns colegas da época”. Talvez tenha sofrido bullying por ter se arrependido. E a Sulamita que esteve dos dois lados: “Eu me calei e já agredi de volta também”, revela ela. Gostaria de partilhar todos os desabafos nesta crônica. Infelizmente, o espaço é restrito. Por isso, escolhi alguns que resumem minha angústia:
– “Ser mulher, negra e gorda são sinônimos de sofrimento. Antes eu chorava, porque não sabia o motivo, agora entendo toda a cultura machista/racista da sociedade. Ainda choro, mas agora tento lutar contra isso”, contou a Juliana.
– “Eu usava um colete ortopédico para correção de escoliose e me chamavam de cavalo de aço, riam, perguntavam, corriam. Um caos”, Fátima relembrou.
– “Sofri bullying dos 7 aos 17 anos. Essas histórias dariam um livro. Até hoje sinto algumas consequências dessas perseguições, mas digo uma coisa: se eu fosse um pouco mais amadurecido nessa época, 90% dessas encheções de saco acabariam rapidinho”, descreveu o João Paulo.
– “Achei que isso fosse uma exclusividade das escolas, infância/adolescência. Porém, é muito forte no mundo corporativo”, expôs o Glauber.
– “Quando tinha 12 anos, eu era muito menor que os outros alunos e alguns idiotas me jogavam na lata de lixo da sala de aula no intervalo das aulas”, Sérgio recordou.
E para encerrar essa reflexão, compartilho o relato do Maycon: “O que eu mais sofri na infância foi bullying na escola, por ter passado a minha infância/adolescência morando em zona rural e até mesmo pela orientação sexual”. Sofro a mesma dor dos meus amigos. Encaro as agressões como motivos para ser mais forte, para amadurecer. E penso que o bullying que passamos, certamente, tem um propósito para nos tornarmos seres humanos melhores. Afinal, quem não tem cicatriz, não tem história.
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Juliano Azevedo
Jornalista, Professor Universitário, Escritor.
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