Vítimas relatam ao BOM DIA as perseguições e humilhações sofridas em escolas
Taís Iatecola
Agência BOM DIA
Quantos  filmes já assistimos com a cena clássica dos grandalhões da equipe de  futebol que infernizam a vida do protagonista da trama, geralmente  franzino e indefeso? É claro que a resposta é: muitos.
As  perseguições, os xingamentos, o isolamento, as humilhações não param  durante boa parte da história, até que o mocinho se rebela e se dá bem  no final. O roteiro é o mesmo da ficção, contudo, na vida real, apesar  das semelhanças (que não são poucas), o final feliz não é o mesmo para a  grande maioria das vítimas de bullying.
Cúmplices em um pacto de silêncio, muitas crianças e adolescentes passam por essa dura experiência sozinhos.
É  o caso da gerente de loja Maria Cecília (nome fictício), hoje com 26  anos. “Tudo começou quando na última série do ensino médio juntaram duas  turmas diferentes na mesma classe. Eu me sentava nas primeiras  carteiras e tirava boas notas, era referência para os professores, só  que isso não agradou”, conta.
Foi o que bastou para começar a  rejeição, o isolamento e as zombarias. “Contavam mentiras e fui perdendo  as pessoas. Certa vez, terminei uma prova e saí da sala. Um deles foi  até a minha carteira já com cola em mãos e fingiu que tirou esse papel  de dentro do meu estojo.”
A maldade poderia ter parado por aí,  mas não. Quase no final do ano um episódio marcou profundamente a  gerente de loja. “Sentaram-se quase todos de um lado da sala, me  deixando sozinha do outro e colocaram sobre as carteiras a espada de São  Jorge e sal grosso.
Quando os professores perguntaram o porquê  daquilo, disseram que era para afastar mau olhado. Nunca contei nada  para minha mãe ou denunciei por vergonha, porque no fundo achava que a  culpa era minha e tinha medo deles acharem o mesmo. A escola não se  manifestou, simplesmente se omitiu. Quase perdi o ano.”
Hoje a  gerente, que se formou em gestão de pessoas, diz ter superado essa fase  difícil, fez terapia e passou a se conhecer melhor.
Casos  como o de Maria Cecília são mais comuns do que se pode imaginar. Às  vezes o desfecho não é parecido, chegando a agressões físicas e, em  casos extremos, à morte. Apesar de esse tipo de ação existir e estar presente, principalmente no ambiente escolar, a sociedade ainda não tem a cultura da denúncia.
“É  uma violência velada, mas sabemos que existe. Contudo, aqui na  Defensoria, não atendemos nenhum caso ainda”, explica a defensora  pública Cássia Zanguetin Michelão.
Ela comenta que é preciso que  os pais e professores estejam atentos ao problema e que campanhas de  respeito à diversidade sejam incluídas na aprendizagem dos jovens.
“É  necessário que essas pessoas tenham acesso a essas informações, que  aceitem a diversidade. Muitas vezes os jovens reproduzem ensinamentos de  incivilidade e os pais devem estar atentos a isso. Eles precisam  aprender que existem regras e elas têm que ser respeitadas No caso do  bullying acredito que a palavra chave é prevenção.”
O BOM DIA  procurou a Secretaria de Estado da Educação para saber sobre número de  denúncias de bullying em escolas da região, entretanto a assessoria não  respondeu aos questionamentos. Apenas informou que mantém 12  professores-mediadores atuando em 11 escolas através do Sistema de  Proteção Escolar.
Vítimas que queiram denunciar a prática de  bullying devem procurar a Defensoria Pública do Estado, que fica  localizada na avenida Sampaio Vidal, 132.
Para especialista, bullying é um problema social
Segundo  a psicóloga Lisete Horn, o bullying é um comportamento hostil,  consciente e repetido, praticado por um ou mais indivíduos com a  intenção de prejudicar ou ofender os outros. “Tem  muitas formas e vai  do mais grave, que se caracteriza pela violência física, aos ataques  verbais.”
Para ela o bullying não é um problema de raiva ou  revolta, mas uma questão grave de um sentimento de aversão e desprezo  com relação a alguém. “É um problema social e acontece em qualquer  lugar. É profundamente perturbador à saúde mental.”
Lisete  comenta que os pais devem estar atentos aos sinais de que os filhos  estão sofrendo bullying, como mudanças no comportamento - ficam mais  quietos, irritados e tristes. “Deve-se acabar com o mito de que se  intervir a violência vai aumentar. Pesquisas mostram que o bullying  acaba quando uma autoridade entra em cena.”
A psicóloga trata  pacientes  vítimas de bullying com psicoterapia cognitivo-  comportamental, juntamente com a família. “Pode chegar a transtornos  maiores que requerem uso de medicação psiquiátrica”, concluiu.
Vítima transforma dor em superação e educa jovens
A  estudante do último ano de psicologia, Karina Zanini Marques da Silva,  29 anos, foi vítima de bullying também no ambiente escolar. “Me mudei  para Marília em 1995, morava em Rondônia. Meu pai tinha uma padaria,  então eu era conhecida como patricinha. As pessoas me isolavam e  zombavam de mim. Era um terrorismo psicológico. Cheguei a perder um ano.  Apesar de reclamar, os professores e diretores nada fizeram.”
Ela  conta que quando iniciou o curso de psicologia teve que fazer terapia.  “A psicóloga me disse que eu enfrentei naquela época uma depressão  sozinha. Só depois que me tornei adulta fui capaz de falar com alguém  sobre isso. Hoje conto minha história para os alunos que assistem às  minhas palestras de orientação e prevenção do bullying.”
Com  alunos de uma escola de ensino fundamental, Karina pintou muros com  mensagens de tolerância e respeito à diversidade. “Eles adoraram e  entenderam que não são impotentes e podem mudar a realidade.” Além das  palestras, Karina também exibiu vídeos sobre o bullying em outras  escolas, inclusive uma particular.
Fonte: Rede Bom Dia. Diário de São Paulo

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