Por - Vinícius Corrêa - vinicius.correa@folhadirigida.com.br
Formada em Direito e Psicologia, Lidia Pereira Galindo tornou-se uma das poucas pesquisadoras de um tema que aflige muitos profissionais, nas mais diferentes áreas: o assédio moral. No caso de quem atua na área de educação, a linha de pesquisa dela é ainda mais importante: ela estuda o problema com foco específico nas instituições de ensino.
Em sua linha de pesquisa, ela vê como fenômenos da mesma natureza, o assédio moral e o bullying. Para a especialista, praticamente não há diferença entre eles, embora estes fenômenos. Um dos aspectos que ela aborda do tema, por exemplo, é como as perseguições sistemáticas feitas no ambiente de trabalho, geralmente protagonizadas por pessoas de em posição superior na hierarquia profissional, podem influenciar na prática do professor, em sala de aula.
Segundo ela, o assédio moral pode ir muito além de desestabilizar emocionalmente o profissional de educação, prejudicando o trabalho com os conteúdos pedagógicos em sala. O profissional pode, com o tempo, sofrer com males como depressão e síndrome do pânico, entre outros. De acordo com a especialista, é fundamental que os educadores entendam que assédio moral é crime e que deve ser denunciado às autoridades.
“De certo o assédio moral/bullying não é um tipo penal, entretanto as condutas que o caracterizam são tipificadas no Código Penal Brasileiro como por exemplo, Maus-tratos (Art. 136); Calúnia (Art. 138); Difamação (Art. 139); Injúria (Art. 140); Constrangimento ilegal (Art. 146); Ameaça (Art. 147); Divulgação de segredo (Art. 153); Furto (Art. 155); Extorsão (Art. 158) e Dano (Art. 163). As condutas do assédio moral/bullying estão tipificadas no Código Penal e, portanto, estamos diante de condutas criminosas”, destacou Lidia Galindo.
A ideia de estudar o assédio moral surgiu em seu consultório de Psicologia, quando ouvia vários relatos de perseguição, humilhação e desrespeito, sofridos por seus pacientes. O resultado deste esforço veio em 2006, quando fez seu trabalho de conclusão de curso em Direito, intitulado “Assédio Moral nas Instituições de Ensino”. Seu objetivo com o trabalho era evidenciar que este é um problema que faz parte da realidade das instituições educacionais de diferentes níveis.
Nesta entrevista, Lidia Galindo fala das motivações que teve para enveredar-se nos estudos desta área, destaca o impacto do problema na vida dos professores que são vítimas dele, explica como o profissional pode provar que sofre perseguição, entre outros temas.
FOLHA LADO — A senhora escreveu, em 2006, o estudo “Assédio moral nas instituições de ensino”. Como surgiu a motivação para realizar esta pesquisa?Lídia Pereira Gallindo — Ao longo da minha caminhada de escuta no consultório como psicóloga e no convívio entre amigos e familiares, ouvi histórias carregadas de sofrimento que remontam a acontecimentos na fase escolar. Histórias com viés muito semelhantes e que chamam a atenção por sua reprodução, passível de ser constatada geração após geração, e em muito se assemelhando a um traço cultural. Nos anos noventa amadureci o desejo de tornar público o quanto os abusos e agressões ocorridas nas instituições de ensino são responsáveis por traumas e angústias significativas, repercutindo na vida emocional, social e econômica das vítimas, muitas vezes por toda a vida. O caminho que visualizei para auxiliar nesse propósito foi o curso de Direito que concluí em meados de 2007 com a apresentação do trabalho de conclusão de curso, em outubro de 2006, sob o título “Assédio Moral nas Instituições de Ensino” publicado em 2009 Revista Ciência Jurídica, Ano XXIII, Número 149, Set/Out de 2009, p.163-256. Edições Ciência Jurídica: Belo Horizonte, MG. Recordo-me do sentimento de estranheza junto aos colegas e docentes quando revelei que queria pesquisar o tema assédio moral nas instituições de ensino.
Por que a senhora acredita que houve este estranhamento?
Alguns ouviram de forma desconfiada, deduzindo erroneamente que a intenção vinculava-se a uma atitude de protesto pelo protesto e no bojo uma pitada de crítica aos professores, coordenadores e demais pessoas envolvidas no processo educacional. Causou-me estranheza a estranheza suscitada pelo tema. Até então, eu não tinha noção que se tratava de um tema pouco estudado, o que ficou claro quando iniciei a busca por literatura sobre o assédio moral. Recordei-me então de um encontro que ocorreu em uma sala de espera de um hospital na cidade de São Paulo. Sentei-me ao lado de uma senhora que estudava sua dissertação de mestrado e que iria defendê-la nos dias seguintes, em maio de 2000, sob o título “Uma Jornada de Humilhações”, publicada em 2001: “Violência, Saúde e Trabalho - Uma jornada de humilhações”. Este encontro marcou-me pelo fato de ter me deparado com uma pessoa capaz de dialogar com intimidade sobre o assédio moral e pelo incentivo para continuar com o meu projeto. Naquele momento eu tive plena convicção que estava diante de mais uma estudiosa sobre o assédio moral. Tempos depois fui perceber que o destino me presenteara quando reservou um lugar ao lado daquela que viria a ser a expoente do assédio moral no Brasil e por quem guardo singular apreço: a doutora Margarida Barreto. Durante o meu processo de pesquisa, ficou nítido que era preciso fazer do trabalho de conclusão de curso um instrumento para divulgar o assédio moral nas instituições de ensino. Era preciso esclarecer e afirmar que ele existe, é real, não é uma brincadeira e não faz parte de um comportamento sadio. Pode-se dizer que o final do século XX revelou o tema do assédio moral, iniciando-se pelo ambiente laboral e em seguida às outras instituições.
De que forma o assédio moral pode interferir no trabalho pedagógico e na qualidade de vida dos professores?
Respondo com o exemplo. Certa vez, acompanhei uma professora depois de um pedido de ajuda, após um encontro com professores onde discutimos o tema do bullying. Ela me relatou a sua angústia diante de uma determinada classe: a 6ª série. Seus alunos tinham entre 12 e 15 anos. No dia da aula ela sentia enjoos, vomitava, sentia muito medo e por vezes saia correndo para sua casa deixando a classe abandonada. Classe sem professor, trabalho pedagógico não realizado. A vida para essa professora parecia não fazer mais sentido dentro e fora da escola ao se sentir um quase nada e experimentar o que denominava pânico e tristeza profunda.
O assédio moral é crime? Se for, é um crime difícil de ser tipificado?
O Código Penal Brasileiro no seu artigo 1º. Inciso XXXIX estabelece que não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. De certo o assédio moral/bullying não é um tipo penal, entretanto as condutas que o caracterizam são tipificadas no Código Penal Brasileiro como por exemplo, Maus-tratos (Art. 136); Calúnia (Art. 138); Difamação (Art. 139); Injúria (Art. 140); Constrangimento ilegal (Art. 146); Ameaça (Art. 147); Divulgação de segredo (Art. 153); Furto (Art. 155); Extorsão (Art. 158) e Dano (Art. 163). As condutas do assédio moral/bullying estão tipificadas no Código Penal e, portanto, estamos diante de condutas criminosas.
Se um professor quiser levar à Justiça a denúncia de um assédio moral que tenha sofrido, o que ele precisa fazer? Que tipo de provas é importante que ele procure reunir?
Ele precisa colecionar todos os tipos de provas possíveis para demonstrar o alegado, como por exemplo, atestados médicos, advertências de superiores, mudança de função, carga horária, testemunhas, vídeos produzidos por câmara de segurança, bilhetes ou cartas ameaçadoras, mensagens eletrônicas, interações em redes sociais e outros. A prova no mundo jurídico é de importância fundamental e sem ela a postulação pode ser inócua.
A senhora também fala do assédio moral entre estudantes. De que forma ele ocorre?
As três caracterizações têm o objetivo de ressaltar a complexidade do fenômeno. O fator comum entre todas as manifestações é que o assédio está vinculado a uma percepção de força e poder do assediador/ofensor sobre o assediado/vítima. As formas como ocorre o assédio se multiplicam e se recriam com criatividade e velocidade tais que nos deixam atônitos.
A sua pesquisa foi feita no início da década passada. Desde então, consegue observar alguma melhoria no quadro do assédio moral nas escolas? Ou os professores estão ainda mais expostos? Houve alguma novidade de lá pra cá?
É importante conhecer para diagnosticar e tratar o assédio moral. Nesse sentido, a produção literária e legislativa foram fundamentais para o processo de conscientização, prevenção e combate ao assédio moral nas instituições de ensino. São inúmeros os projetos nesse sentido. As escolas estão muito mais atentas e com programas que envolvem não só os alunos mais também os pais. Temos os tribunais julgando casos de assédio moral/bullying, condenando escolas e alunos e pais de alunos. No meu blog, encontram-se alguns julgados. No meu trabalho de conclusão do 4º Curso de Especialização em Direito Público na Escola Superior do Ministério Público de São Paulo sob o título “Bullying - Sedimentação do Fenômeno Social e Análise Crítica Frente ao Direito” (2011) eu faço um retrospecto do assédio moral nas instituições de ensino/bullying.
Qual o balanço que a senhora faz, nesta retrospectiva?
Por exemplo, em 2002, Henrique Carivaldo de Miranda Neto defendeu sua Dissertação de Mestrado na Unit – Centro Universitário do Triângulo, Uberlândia, em Minas Gerais, sob o título “Assédio Moral: Constrangimento e Humilhação em Instituições de Ensino Superior”; em 2004, criação do projeto bullying pela Cia Atores de Mar; em 2006, visando à conclusão do curso de Direito produzimos a monografia sob o título “Assédio Moral nas Instituições de Ensino”. A partir de 2008 observamos um aumento significativo de publicações e produções legislativas. Em 2009, foi realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), em convênio com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC), pesquisa sobre preconceito e discriminação em contexto escolar. “A pesquisa abrangeu 18.599 respondentes em 501 escolas de 27 Estados, incluindo estudantes, professores, diretores, demais profissionais de educação e pais ou responsáveis”. Também em 2009, foi realizado o Simpósio da Comissão do Jovem Advogado da OAB/SP, Coordenadoria de Direito Educacional, que abordou o tema do assédio moral nas instituições de ensino. Em outubro de 2009, o Ministério Público do Estado do Mato Grosso realizou audiência pública para discutir a questão do bullying nos estabelecimentos de ensino devido às constantes reclamações sobre atos de violência física e psicológica praticados pelos próprios alunos nas escolas municipais e por ter sido procurado por diversas mães para reclamar que seus filhos vêm sofrendo atos de violência (física e psicológica) por parte de outros colegas e que as escolas não estão adotando as providências necessárias para combater o problema. Em 2010 foi publicado pela Casa do Psicólogo o livro “Bullying – razão instrumental e preconceito” escrito por Deborah Christina Antunes, uma obra indispensável para quem se dedica ao tema do assédio moral nas instituições de ensino. Em 2012, demonstrei no meu trabalho de conclusão de Master in Business Administration em Gestão e Direito Educacional pela Escola Paulista de Direito (EPD), sob o título “O Gestor e o Direito Educacional Frente ao Bullying”, que a produção legislativa sobre o bullying que se iniciou em 2008 com a lei do Município de João Pessoa, na Paraíba. Em 2009 foram produzidas 13 leis, em 2010, 33 leis e em 2011, 19 leis. A produção legislativa de 2010 para 2011 diminuiu, mas ainda assim é maior do que nos anos de 2008 e 2009.
Que ações o poder público ou outras instituições da sociedade poderiam colocar em prática para o combate ao assédio moral nas instituições de ensino?
Se por um lado temos a iniciativa de criminalizar o bullying, por outro é louvável a criação de leis que têm como objetivo a conscientização, a prevenção e o combate ao assédio moral/bullying lançando mão dos métodos alternativos de solução de conflitos. Isso demonstra que, de certa forma, a sociedade anseia e tem esperança que seja possível educar o indivíduo para que ele exerça a sua cidadania plena e que cultive uma sociedade fundamentada no diálogo, na tolerância e na convivência pacífica. Eu penso que o exemplo é a melhor maneira de se educar, e nesse sentido, não há melhor ação por parte do poder público, das instituições de ensino, das comunidades e da família de serem modelos positivos. É preciso ter em mente que o preconceito e a intolerância estão no âmago das práticas de assédio moral.
Em sua linha de pesquisa, ela vê como fenômenos da mesma natureza, o assédio moral e o bullying. Para a especialista, praticamente não há diferença entre eles, embora estes fenômenos. Um dos aspectos que ela aborda do tema, por exemplo, é como as perseguições sistemáticas feitas no ambiente de trabalho, geralmente protagonizadas por pessoas de em posição superior na hierarquia profissional, podem influenciar na prática do professor, em sala de aula.
Segundo ela, o assédio moral pode ir muito além de desestabilizar emocionalmente o profissional de educação, prejudicando o trabalho com os conteúdos pedagógicos em sala. O profissional pode, com o tempo, sofrer com males como depressão e síndrome do pânico, entre outros. De acordo com a especialista, é fundamental que os educadores entendam que assédio moral é crime e que deve ser denunciado às autoridades.
“De certo o assédio moral/bullying não é um tipo penal, entretanto as condutas que o caracterizam são tipificadas no Código Penal Brasileiro como por exemplo, Maus-tratos (Art. 136); Calúnia (Art. 138); Difamação (Art. 139); Injúria (Art. 140); Constrangimento ilegal (Art. 146); Ameaça (Art. 147); Divulgação de segredo (Art. 153); Furto (Art. 155); Extorsão (Art. 158) e Dano (Art. 163). As condutas do assédio moral/bullying estão tipificadas no Código Penal e, portanto, estamos diante de condutas criminosas”, destacou Lidia Galindo.
A ideia de estudar o assédio moral surgiu em seu consultório de Psicologia, quando ouvia vários relatos de perseguição, humilhação e desrespeito, sofridos por seus pacientes. O resultado deste esforço veio em 2006, quando fez seu trabalho de conclusão de curso em Direito, intitulado “Assédio Moral nas Instituições de Ensino”. Seu objetivo com o trabalho era evidenciar que este é um problema que faz parte da realidade das instituições educacionais de diferentes níveis.
Nesta entrevista, Lidia Galindo fala das motivações que teve para enveredar-se nos estudos desta área, destaca o impacto do problema na vida dos professores que são vítimas dele, explica como o profissional pode provar que sofre perseguição, entre outros temas.
FOLHA LADO — A senhora escreveu, em 2006, o estudo “Assédio moral nas instituições de ensino”. Como surgiu a motivação para realizar esta pesquisa?Lídia Pereira Gallindo — Ao longo da minha caminhada de escuta no consultório como psicóloga e no convívio entre amigos e familiares, ouvi histórias carregadas de sofrimento que remontam a acontecimentos na fase escolar. Histórias com viés muito semelhantes e que chamam a atenção por sua reprodução, passível de ser constatada geração após geração, e em muito se assemelhando a um traço cultural. Nos anos noventa amadureci o desejo de tornar público o quanto os abusos e agressões ocorridas nas instituições de ensino são responsáveis por traumas e angústias significativas, repercutindo na vida emocional, social e econômica das vítimas, muitas vezes por toda a vida. O caminho que visualizei para auxiliar nesse propósito foi o curso de Direito que concluí em meados de 2007 com a apresentação do trabalho de conclusão de curso, em outubro de 2006, sob o título “Assédio Moral nas Instituições de Ensino” publicado em 2009 Revista Ciência Jurídica, Ano XXIII, Número 149, Set/Out de 2009, p.163-256. Edições Ciência Jurídica: Belo Horizonte, MG. Recordo-me do sentimento de estranheza junto aos colegas e docentes quando revelei que queria pesquisar o tema assédio moral nas instituições de ensino.
Por que a senhora acredita que houve este estranhamento?
Alguns ouviram de forma desconfiada, deduzindo erroneamente que a intenção vinculava-se a uma atitude de protesto pelo protesto e no bojo uma pitada de crítica aos professores, coordenadores e demais pessoas envolvidas no processo educacional. Causou-me estranheza a estranheza suscitada pelo tema. Até então, eu não tinha noção que se tratava de um tema pouco estudado, o que ficou claro quando iniciei a busca por literatura sobre o assédio moral. Recordei-me então de um encontro que ocorreu em uma sala de espera de um hospital na cidade de São Paulo. Sentei-me ao lado de uma senhora que estudava sua dissertação de mestrado e que iria defendê-la nos dias seguintes, em maio de 2000, sob o título “Uma Jornada de Humilhações”, publicada em 2001: “Violência, Saúde e Trabalho - Uma jornada de humilhações”. Este encontro marcou-me pelo fato de ter me deparado com uma pessoa capaz de dialogar com intimidade sobre o assédio moral e pelo incentivo para continuar com o meu projeto. Naquele momento eu tive plena convicção que estava diante de mais uma estudiosa sobre o assédio moral. Tempos depois fui perceber que o destino me presenteara quando reservou um lugar ao lado daquela que viria a ser a expoente do assédio moral no Brasil e por quem guardo singular apreço: a doutora Margarida Barreto. Durante o meu processo de pesquisa, ficou nítido que era preciso fazer do trabalho de conclusão de curso um instrumento para divulgar o assédio moral nas instituições de ensino. Era preciso esclarecer e afirmar que ele existe, é real, não é uma brincadeira e não faz parte de um comportamento sadio. Pode-se dizer que o final do século XX revelou o tema do assédio moral, iniciando-se pelo ambiente laboral e em seguida às outras instituições.
De que forma o assédio moral pode interferir no trabalho pedagógico e na qualidade de vida dos professores?
Respondo com o exemplo. Certa vez, acompanhei uma professora depois de um pedido de ajuda, após um encontro com professores onde discutimos o tema do bullying. Ela me relatou a sua angústia diante de uma determinada classe: a 6ª série. Seus alunos tinham entre 12 e 15 anos. No dia da aula ela sentia enjoos, vomitava, sentia muito medo e por vezes saia correndo para sua casa deixando a classe abandonada. Classe sem professor, trabalho pedagógico não realizado. A vida para essa professora parecia não fazer mais sentido dentro e fora da escola ao se sentir um quase nada e experimentar o que denominava pânico e tristeza profunda.
O assédio moral é crime? Se for, é um crime difícil de ser tipificado?
O Código Penal Brasileiro no seu artigo 1º. Inciso XXXIX estabelece que não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. De certo o assédio moral/bullying não é um tipo penal, entretanto as condutas que o caracterizam são tipificadas no Código Penal Brasileiro como por exemplo, Maus-tratos (Art. 136); Calúnia (Art. 138); Difamação (Art. 139); Injúria (Art. 140); Constrangimento ilegal (Art. 146); Ameaça (Art. 147); Divulgação de segredo (Art. 153); Furto (Art. 155); Extorsão (Art. 158) e Dano (Art. 163). As condutas do assédio moral/bullying estão tipificadas no Código Penal e, portanto, estamos diante de condutas criminosas.
Se um professor quiser levar à Justiça a denúncia de um assédio moral que tenha sofrido, o que ele precisa fazer? Que tipo de provas é importante que ele procure reunir?
Ele precisa colecionar todos os tipos de provas possíveis para demonstrar o alegado, como por exemplo, atestados médicos, advertências de superiores, mudança de função, carga horária, testemunhas, vídeos produzidos por câmara de segurança, bilhetes ou cartas ameaçadoras, mensagens eletrônicas, interações em redes sociais e outros. A prova no mundo jurídico é de importância fundamental e sem ela a postulação pode ser inócua.
A senhora também fala do assédio moral entre estudantes. De que forma ele ocorre?
As três caracterizações têm o objetivo de ressaltar a complexidade do fenômeno. O fator comum entre todas as manifestações é que o assédio está vinculado a uma percepção de força e poder do assediador/ofensor sobre o assediado/vítima. As formas como ocorre o assédio se multiplicam e se recriam com criatividade e velocidade tais que nos deixam atônitos.
A sua pesquisa foi feita no início da década passada. Desde então, consegue observar alguma melhoria no quadro do assédio moral nas escolas? Ou os professores estão ainda mais expostos? Houve alguma novidade de lá pra cá?
É importante conhecer para diagnosticar e tratar o assédio moral. Nesse sentido, a produção literária e legislativa foram fundamentais para o processo de conscientização, prevenção e combate ao assédio moral nas instituições de ensino. São inúmeros os projetos nesse sentido. As escolas estão muito mais atentas e com programas que envolvem não só os alunos mais também os pais. Temos os tribunais julgando casos de assédio moral/bullying, condenando escolas e alunos e pais de alunos. No meu blog, encontram-se alguns julgados. No meu trabalho de conclusão do 4º Curso de Especialização em Direito Público na Escola Superior do Ministério Público de São Paulo sob o título “Bullying - Sedimentação do Fenômeno Social e Análise Crítica Frente ao Direito” (2011) eu faço um retrospecto do assédio moral nas instituições de ensino/bullying.
Qual o balanço que a senhora faz, nesta retrospectiva?
Por exemplo, em 2002, Henrique Carivaldo de Miranda Neto defendeu sua Dissertação de Mestrado na Unit – Centro Universitário do Triângulo, Uberlândia, em Minas Gerais, sob o título “Assédio Moral: Constrangimento e Humilhação em Instituições de Ensino Superior”; em 2004, criação do projeto bullying pela Cia Atores de Mar; em 2006, visando à conclusão do curso de Direito produzimos a monografia sob o título “Assédio Moral nas Instituições de Ensino”. A partir de 2008 observamos um aumento significativo de publicações e produções legislativas. Em 2009, foi realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), em convênio com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC), pesquisa sobre preconceito e discriminação em contexto escolar. “A pesquisa abrangeu 18.599 respondentes em 501 escolas de 27 Estados, incluindo estudantes, professores, diretores, demais profissionais de educação e pais ou responsáveis”. Também em 2009, foi realizado o Simpósio da Comissão do Jovem Advogado da OAB/SP, Coordenadoria de Direito Educacional, que abordou o tema do assédio moral nas instituições de ensino. Em outubro de 2009, o Ministério Público do Estado do Mato Grosso realizou audiência pública para discutir a questão do bullying nos estabelecimentos de ensino devido às constantes reclamações sobre atos de violência física e psicológica praticados pelos próprios alunos nas escolas municipais e por ter sido procurado por diversas mães para reclamar que seus filhos vêm sofrendo atos de violência (física e psicológica) por parte de outros colegas e que as escolas não estão adotando as providências necessárias para combater o problema. Em 2010 foi publicado pela Casa do Psicólogo o livro “Bullying – razão instrumental e preconceito” escrito por Deborah Christina Antunes, uma obra indispensável para quem se dedica ao tema do assédio moral nas instituições de ensino. Em 2012, demonstrei no meu trabalho de conclusão de Master in Business Administration em Gestão e Direito Educacional pela Escola Paulista de Direito (EPD), sob o título “O Gestor e o Direito Educacional Frente ao Bullying”, que a produção legislativa sobre o bullying que se iniciou em 2008 com a lei do Município de João Pessoa, na Paraíba. Em 2009 foram produzidas 13 leis, em 2010, 33 leis e em 2011, 19 leis. A produção legislativa de 2010 para 2011 diminuiu, mas ainda assim é maior do que nos anos de 2008 e 2009.
Que ações o poder público ou outras instituições da sociedade poderiam colocar em prática para o combate ao assédio moral nas instituições de ensino?
Se por um lado temos a iniciativa de criminalizar o bullying, por outro é louvável a criação de leis que têm como objetivo a conscientização, a prevenção e o combate ao assédio moral/bullying lançando mão dos métodos alternativos de solução de conflitos. Isso demonstra que, de certa forma, a sociedade anseia e tem esperança que seja possível educar o indivíduo para que ele exerça a sua cidadania plena e que cultive uma sociedade fundamentada no diálogo, na tolerância e na convivência pacífica. Eu penso que o exemplo é a melhor maneira de se educar, e nesse sentido, não há melhor ação por parte do poder público, das instituições de ensino, das comunidades e da família de serem modelos positivos. É preciso ter em mente que o preconceito e a intolerância estão no âmago das práticas de assédio moral.
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