sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Professor gago relata sua experiência com bullying em livro

Claudio Ramirez chegou a pensar em suicídio

“O bullying é uma forma de morrer e continuar respirando”. É assim, sem maiores rodeios, que o professor Claudio Ramirez, um chileno de 48 anos, radicado no Brasil desde 1971, define o sofrimento pelo qual passou por ser perseguido na infância e na adolescência devido a sua gagueira.

 
Ele detalha essa terrível experiência no recém-lançado “Bullying, Eu Sobrevivi!” (Editora Idéias & Letras, 168 páginas), livro-depoimento em que explora os aspectos subjetivos de sua experiência com a gagueira de forma simples e clara.

Ramirez conta, por exemplo, como o seu primeiro amor deu-se de forma silenciosa, através de bilhetes, com uma menininha chilena. E se lembra de como nas escolas onde estudou, tanto no Chile quanto no Brasil, sempre foi alvo de gozações, sem nunca ter contado com apoio pedagógico adequado para lidar com a sua necessidade especial.

Oscilou entre períodos de retração, agressividade e resignação. “Ninguém se mexeu na tentativa de me ajudar, mas eu já estava acostumado com o fato de que ninguém me quisesse por perto”, desabafa, revelando que chegou a pensar em suicídio.

Ramirez fez faculdade de Educação Física e, mesmo sendo bom aluno, enfrentou cruel discriminação ao entrar para o mercado de trabalho. Foram um professor da faculdade e sua mulher que lhe deram forças para lidar com as situações constrangedoras de forma tranquila e até com humor. Quando seus alunos riam de sua gagueira, perguntava se estavam entendendo o que ele dizia. “Se sim, isso é o que importa”.

Aos poucos, foi vendo que podia usar a gagueira a seu favor, tornando-a uma fonte de respeito, pelo seu esforço de superação. O professor conseguiu se firmar profissionalmente no campo de seus sonhos, a comunicação, atuando como palestrante na área de inclusão social, motivação pessoal e gerenciamento. Também trabalha como professor de Gerenciamento e Liderança, Relações Interpessoais e Jogos Empresariais. Ele ainda mantém o blog http://profclaudioramirez.blogspot.com. Sobre o seu livro e o bullying, Ramirez deu a entrevista a seguir. 

Quando o senhor percebeu que a gagueira seria um grande problema em sua vida?
No início, me utilizava dela para chamar a atenção, mas, com a chegada da escola e diante de outras crianças, ficou difícil.

E o bullying, quando surgiu?
No início escolar.

Além das gozações, houve algo mais, como agressões físicas, por exemplo?
Como sempre fui robusto, e por minha posição fechada aos outros, acredito que inibia qualquer agressão física.

Como o bullying afetou seu desenvolvimento socioeducacional?
A falta de convívio social levava a um quadro de isolamento.

Qual era a reação de seus pais perante seu sofrimento? E dos professores?
Como não costumava expressar claramente esse problema com meus pais, eles não encaravam como problema. Quanto aos professores, eles preferiam não se envolver.

Ser estrangeiro tornou o problema ainda maior?
Com certeza, pois o sotaque acentuava ainda mais o desconforto.

Quais os piores momentos pelos quais o senhor passou por causa do bullying?
O medo de me comunicar me levava a um estado de espera e ensaio, do tipo “vou não vou”, deixando escapar oportunidades.

Quando o senhor se deu conta de que era preciso dar a volta por cima?
Com a chegada ao mercado de trabalho, agora como professor de Educação Física, tive que enfrentar os alunos. Até hoje tenho que enfrentar o preconceito do mercado de trabalho.

Se pudesse escolher, o senhor optaria por não nascer gago ou acredita que essa é uma característica que lhe rendeu aprendizado para outros aspectos de sua vida?
Aprendi a superar dificuldades e tive experiências de aprendizado muito ricas pelo fato de ser gago. Sou reconhecido profissionalmente, mas é claro que o mundo é mais fácil para aqueles que se enquadram no que chamamos normalidade. Se tivesse que escolher entre ser ou não ser gago, seria como escolher entre ser e não ser eu.

Como veio a decisão de escrever um livro sobre sua experiência com o bullying?
Com a chegada do tema bullying na mídia, começou uma corrida de explicações, a maioria delas muito bem baseadas em fenômenos sociais e números estatísticos, o que, de certa forma, afastava ainda mais as vítimas dos relacionamentos. Então, incentivado pela minha esposa, que sempre me viu enfrentar os desafios, resolvi escrever dando um novo ponto de vista, de quem está envolvido diretamente e sofre as consequências.

O senhor acredita que o livro ajudará também quem sofre bullying por outros motivos que não a gagueira?
A guagueira é um entre inúmeros processos que levam ao bullying, mas acredito que a proximidade emocional das vítimas tenha sempre um mesmo ponto de encontro, buscando a superação. Assim, tanto os que sofrem bullying como aqueles que convivem com eles podem se orientar lendo minhas experiências, e assim facilitar, ajudar e superar, aquilo que eu chamo no livro de ressuscitar, pois muitas vezes as pessoas morrem emocionalmente.

Fonte: EPTV

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