segunda-feira, 4 de junho de 2012

Portugal: BH pouco investe em educação

Representante do PSTU na luta pela Prefeitura de Belo Horizonte fala sobre os problemas básicos da cidade
 

A professora afirma que a capital mineira atravessa um momento complicado na educação e que os investimentos estão longe do ideal Gustavo Duarte/ Metro BH


Pré-candidata do PSTU (Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado) à Prefeitura de Belo Horizonte, Vanessa Portugal fala com exclusividade ao Metro sobre problemas da cidade, eleições municipais e quais são seus objetivos caso consiga alcançar o  posto máximo no Executivo da capital mineira.

Na sua opinião, quais são os maiores defeitos e as virtudes de Belo Horizonte a se administrar nos próximos anos?

BH é uma cidade grande que tem uma quantidade de recursos enorme. A arrecadação da cidade aumentou quase seis vezes no último período. Isso significa que é uma cidade que tem plenas condições de atender boa parte das demandas dos trabalhadores. O desafio é governar para atender o interesse da maioria da população que trabalha em Belo Horizonte. É preciso enfrentar os grandes empresários que ganham com o monopólio do transporte na cidade para que você tenha um transporte alternativo de fato. É preciso enfrentar o monopólio das grandes construtoras para que se tenha um projeto de moradia para a população de Belo Horizonte.

Qual é a atual situação da cidade em relação às moradias populares?
Hoje o projeto da cidade de atendimento de moradias populares não consegue sequer suprir a geração de nova demanda que aumenta, e muito, a cada ano. Ou seja, é preciso um investimento em massa nisso. Saúde também é um problema crônico não só no Estado, mas aqui na cidade em especial. E a questão da educação. Na verdade, Belo Horizonte hoje não investe o que a lei orgânica determina na educação municipal. BH pouco investe na saúde e na educação. Belo Horizonte tem hoje 100% de gestão sobre o SUS.

Apesar disso, ainda faltam leitos e há ?las para marcação de consultas eletivas. Como diminuir esse problema?

A primeira questão tem a ver com investimento. Quando a gente pega o gráfico que mostra para onde vão os recursos de Belo Horizonte, a gente percebe que a coluna do gasto com terceirização e pagamento da dívida é infinitamente maior que o investimento em saúde e educação. Então se você não tem um investimento de parte significativa dos recursos nessas áreas, é difícil que se consiga estabelecer um programa razoável. A segunda: é necessário que você tenha um processo de descentralização da especialização para que as pessoas possam ser atendidas, nas suas necessidades, em consultas especializadas antes que cheguem a necessitar de um leito de hospital. E a terceira: tem que se investir em estruturas públicas de saúde. Hoje boa parte dos leitos do SUS são instituições privadas e não instituições públicas. Isso significa que o SUS garante não só o atendimento, mas também o lucro de quem é o dono de uma instituição privada e nós achamos que melhoraria bastante a qualidade se aumentassem os recursos e se esses recursos fossem investidos em prol da saúde, e não de garantir o lucro de muitos empresários.

Até hoje, o metrô de BH não saiu do papel. A?nal, o que a capital tem é um trem de superfície. Além disso, a cidade não possui rotas alternativas às grandes avenidas para desafogar o trânsito. O que falta para melhorar o trânsito até que o metrô seja expandido?
Isso não tem saída até que o metrô saia do papel. Mas podem ser adotadas algumas medidas paliativas. Por exemplo, não adianta alargar avenida. A impressão que nós temos é que BH está há mais de dez anos em obras, que as obras não acabam. Porque assim que elas acabam, elas começam de novo e, às vezes, pegando as mesmas vias, já que elas esgotaram a sua eficiência. Então tem que investir no metrô. Tem que se investir de fato nos transportes alternativos que não os rodoviários. Esse é um elemento. O metrô de Belo Horizonte está há 20 anos atrasado. As linhas que estavam previstas para serem construídas há 20 anos até hoje não foram construídas. Nós vivemos um atraso enorme.

Há outros elementos que prejudicam a evolução desse quadro na cidade?

Tem outros sim. As pessoas se esqueceram que transporte público chama-se público porque é público, é uma concessão que se faz às empresas privadas. Isso faz com que o transporte de Belo Horizonte seja escasso e caro. Não é que você tenha alternativa sempre de deixar o carro em casa. É que não dá para se usar ônibus dependendo da rota que você tem que fazer. O transporte de ônibus é muito caro e raro. Há bairros na cidade em que os ônibus passam de 40 em 40 minutos.

Você é a favor ou contra a implantação do rodízio de carros em Belo Horizonte?
Eu acho que não tem problema com o rodízio. A questão é que ele não resolve, já que se você não der uma alternativa para que as pessoas se locomovam, não resolve o impasse. Não adianta só colocar o rodízio. Vai ter o rodízio, mas, e aí? Como as pessoas vão sair de casa?  O transporte coletivo de Belo Horizonte não aguenta o suporte da população como um todo. Ele não aguenta. Os ônibus hoje estão completamente lotados.

Embora o número de vagas atenda todas as crianças em idade escolar em BH, a totalidade dessas crianças ainda não está matriculada. Qual é o motivo disso?
São duas coisas no município de Belo Horizonte. Em termo de vagas, o ensino fundamental está resolvido. A educação infantil e o ensino médio, não. Por quê? Na educação infantil faltam vagas mesmo. Você tem talvez vagas para menos de 20% das crianças da cidade. Tem que se abrir novos postos. Com relação ao ensino médio, também tem um problema na cidade. Aí sim é onde pega o problema das escolas distantes e as vagas estão distribuídas entre o diurno e o noturno e, na verdade, o jovem, mesmo na idade regular, tem que ir para o noturno e a escola é distante e ele não tem condição de chegar lá.

Isso gera desistências?

Hoje temos um número de abandono muito grande no ensino médio. Em Belo Horizonte, a lei orgânica do município diz que tem que se investir 30% da arrecadação em educação. BH investe 19%. No início dos anos 90, foi votada uma alteração na lei orgânica do município, ampliando esse mínimo para 30% de toda a arrecadação do município. Belo Horizonte não cumpre isso. Essa é a primeira medida: tem que cumprir. Porque se você tem que ter um momento de expansão de prédios e de construção de instrumentos públicos de atendimento, tem que ter recurso extra. Não tem jeito de construir escola se você não tem verba liberada. Belo Horizonte precisa da construção de escolas infantis em larga escala e precisa abrir turmas  do ensino médio. Existe uma divisão: o município fica com ensino fundamental e educação infantil e o Estado prioritariamente com o ensino médio.

A divisão resulta em fatores negativos?
Sim, claro. Você tem turmas fechadas dentro de escolas municipais, principalmente à noite, e você não oferece o ensino médio próximo da localização das pessoas. É uma combinação dessas coisas que precisa ser feita. Belo Horizonte tem recursos para isso. Para resolver tudo de uma vez, não. Mas tem recurso para se resolver o problema em curto prazo.

E o impasse salarial dos professores?
Com relação aos salários, aqui nós temos dois pontos: temos o problema do salário inicial. Belo Horizonte vive uma defasagem do salário inicial de aproximadamente 30% que precisa ser corrigida, já que tem que ter um incentivo ao professor para que ele trabalhe menos horas no dia, para que a interação dele com os estudantes seja melhor.  E tem um problema na carreira que é mais explícito na educação infantil. Tivemos uma greve em função disso, mas não é só na educação infantil. Hoje a carreira do ensino fundamental também está congelada por uma série de exigências que a prefeitura está impondo. Então são dois mecanismos que precisam conversar. O que fazer? Investir pelo menos o que a lei diz. Não dá pra resolver tudo de uma vez, mas dá pelo menos para avançar num curto prazo e melhorar a questão.

Apesar de a segurança pública ser responsabilidade dos governos Federal e Estadual, atualmente muitas cidades possuem guardas municipais. O que o município pode fazer para melhorar a  segurança na capital?

Primeiro é uma discussão sobre qual é o papel da Guarda Municipal. A instituição é uma guarda patrimonial. Aliás, acho que até a Polícia Militar é patrimonial. Os instrumentos de segurança são muito mais para proteger a propriedade do que para proteger as pessoas. A violência se dá hoje pelo tráfico, pela condição social, pela polícia e pelo Estado. Não é verdade que existe violência unilateral. O que nós achamos é que o problema de violência, a questão da segurança, não se resolve tão facilmente.

O social também tem influência direta nisso?

Vou além disso. Se você não tem um programa de construção de moradias decentes, que desestimule a formação dos aglomerados, se você não tem um programa que permite às pessoas terem um grau de empregabilidade, com condição de sobrevivência, um programa de perspectiva para juventude, não se resolve o problema da segurança. Não existe forma de minimizar a falta de segurança aumentando a repressão. Infelizmente ou felizmente. São alguns programas que, num curto prazo, podem de fato melhorar a condição de vida e diminuir a tensão que gera a violência.

O município tem hoje um número exagerado de funcionários públicos terceirizados nos setores primário, secundário e terciário. Isso é prejudicial? Como adequar isso à necessidade da capital?
É a principal rubrica da cidade. Belo Horizonte gasta mais com terceirização do que com saúde, educação e habitação juntas. A terceirização tem dois vieses: favorecer as empresas que depois vão financiar as campanhas eleitorais, já que os candidatos se elegem, as empresas pegam contratos com a prefeitura e uma parte do dinheiro que recebem nesses contratos, elas devolvem nas campanhas eleitorais. O segundo ponto é a precarização do trabalho. Olha só: nós somos contra a terceirização. Uma coisa é que, em obras pontuais, você pode contratar uma determinada empresa para realizar. Mas a terceirização dos serviços como é feita no município, que chega às vezes a deixar ociosos funcionários e estruturas que a prefeitura tem dentro dela, que é o caso dos engenheiros, por exemplo. A limpeza urbana também exemplifica.

Isso ocorre nas escolas?
Na educação, o que se gastava com empresas terceirizadas para limpeza, merenda e outras coisas era mais do que com o trabalhador concursado. Não o que o trabalhador recebia. Mas a prefeitura gastava com o terceirizado três vezes mais do que ela gastava com o concursado, embora o salário do trabalhador terceirizado fosse menor.

Belo Horizonte é basicamente uma cidade movimentada pelos setores de hotelaria e serviços.  Como aumentar a oferta de empregos na capital? E como investir na formação de novos jovens?
O investimento na formação acontece quando se pensa na educação. É preciso sim ter um incentivo à formação técnica, mas tem que ter uma formação técnica mais completa, não a formação de um trabalhador que não vai ter perspectivas de crescimento. Sobre a geração de emprego, nós achamos que primeiro é preciso ter um plano de obras públicas para que você tenha um processo de geração de vagas e é preciso, ao contrário do que se diz por aí, que o município arrecade, para que ele possa fomentar tanto a formação quanto as iniciativas próprias das pessoas da cidade.

BH possui algumas dessas iniciativas para geração?
A cidade tem algumas medidas pequenas que são geradoras de emprego e de renda para a cidade. É rica na perspectiva da confecção, do artesanato. É claro que não estamos propondo uma saída ao inverso da industrialização, embora não seja uma cidade considerada um polo industrial. Mas isso não pode representar a isenção de impostos para as grandes empresas, porque na verdade o que elas deixam de pagar em impostos é muito mais do que o que elas geram em termos de empregos. Se poderia gerar muito mais empregos por conta própria se investissem nisso do que desonerando os impostos.

A capital está preparada para a Copa do Mundo? Que legado o evento deixará?

Belo Horizonte não está preparada para receber um montante grande de pessoas. Me assusta muito o que é a preparação para a Copa. Nós somos contra qualquer obra que signifique jogar para fora a população mais pobre da cidade, a classe trabalhadora, que é a tendência do que está acontecendo, e de obras que vão custar milhões para atender o turista da Copa, mas que não são obras permanentes para a cidade. Já que temos que investir para a Copa, vamos investir em moradia de qualidade dentro de BH, e não fora; vamos investir no transporte de qualidade. Porque a Copa acaba rápido e a população fica pagando a conta por muito tempo. Legado? Vai deixar uma dívida para a população. E um outro legado que é o processo que nós estamos vivendo de desalojamento de pessoas em função das obras.

Resuma em três frases o seu programa de governo.

Nós queremos instituir um governo dos trabalhadores e para os trabalhadores, de verdade. Um governo que inverta as prioridades da cidade, que deixe de proteger só a elite de Belo Horizonte, que precisa pouco do Estado, e que invista na maioria da população que precisa de apoio urgente dos governantes.
 

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