segunda-feira, 20 de julho de 2015

‘É preciso ensinar além das DSTs nas escolas’, diz psicopedagoga e educadora

A entrevistada deste domingo, psicopedagoga e educadora sexual Christiane Andrea, alerta para a importância de se falar sobre sexualidade nas escolas, principalmente na atual era virtual


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Há mais de 15 anos atuando como professora nas redes públicas e privadas da Região, a psicopedagoga, educadora sexual e pós-graduanda em Terapia Sexual Christiane Andrea — hoje atuando como orientadora educacional na rede pública de Santos — enxergou no seu cotidiano profissional a necessidade de falar sobre sexo com os adolescentes.

Para isso, após tirar muitas dúvidas dos adolescentes que a procuravam, ela resolveu estudar mais sobre o assunto e agora roda as unidades de ensino palestrando sobre os resultados nocivos da falta de informação sexual em tempos de internet: cyberbullying, sexting e grooming. Achou os nomes estranhos? Não sabe nem por onde começar para explicar sobre isso aos seus filhos? Então, acompanhe a entrevista que a psicopedagoga concedeu ao Papo de Domingo:



Diário do Litoral - Como é o projeto que você está desenvolvendo nas escolas de Santos?

Christiane Andrea - O projeto surgiu de uma necessidade que eu tenho acompanhado dentro das escolas em relação a esta questão da liberdade dos jovens na internet e o fato deles não estarem usando toda esta tecnologia adequadamente, colocando até mesmo a vida em risco. É uma palestra em que eu falo sobre cyberbullying, sexting e grooming.

DL - Qual a diferença entre cyberbulling, sexting e grooming?

Christiane - O cyberbullying é o conhecido bullying através dos meios de comunicação virtuais: SMS, redes sociais, Whatsapp. Ou seja, a prática do bullying virtual. O sexting é o ato de promover fotos e vídeos de cunho sexual por estes meios. E grooming é o aliciamento psicológico através da internet. Por exemplo, é através do grooming que estão aliciando jovens para o Estado Islâmico. É muito perigoso. Este aliciamento pode levar um jovem a se suicidar, dependendo do estado psicológico que ele estiver.

DL - E a palestra vai abordar como estes três temas?

Christiane - A ideia é orientar. Eu estou percorrendo as escolas públicas e privadas de Santos. Por enquanto, só aqui na Cidade. Mas já recebi convite para fazer palestras em escolas de Cubatão. É preciso abordar este assunto no maior número de escolas possível. Em todo o Brasil.

DL - O público alvo é só adolescente ou crianças menores também participam das palestras — as crianças estão usando a internet cada vez mais cedo?

Christiane - No momento, estes assuntos, estou tratando com adolescentes de sétima à nona série e jovens do Ensino Médio. A questão das crianças teria que ser algo mais profundo como, por exemplo, começar a tratar de Educação Sexual dentro das escolas.

DL - Você, então, acredita que falta tratar mais sobre este assunto nas escolas?

Christiane - Só se trata de HPV, Aids. Mas a sexualidade envolve muito mais que isso. É preciso ensinar além das DSTs (doenças sexualmente transmissíveis) nas escolas.

DL - Como e quando você começou a se interessar pela Educação Sexual?

Christiane - Eu comecei a me interessar justamente por acompanhar esta deficiência nas escolas em que trabalhei. Atuei como professora há mais de 15 anos dentro das redes privadas, estaduais e municipais. Sempre com adolescente. Eu era aquela professora que as meninas procuravam — talvez por eu dar mais abertura — para tirar dúvida, desabafar sobre algumas coisas e tratar sobre assuntos que não tinha a liberdade de falar em casa com os pais. Eu sempre procurei orientar com a conversa. Por isso, busquei estudar sobre o assunto e me aperfeiçoar para poder orientar melhor.

DL - Você acredita que irá enfrentar algum tipo de problema ou preconceito com os pais sobre os temas desta palestra ou sobre a defesa da educação sexual dentro das escolas? Há um bloqueio dos pais para tratar deste assunto?

Christiane - Com os temas da palestra, eu não tenho encontrado resistência porque é um problema sério que está acontecendo dentro das escolas e, infelizmente, vem abalando muitas famílias. As meninas estão cada dia mais postando fotos sensuais, vídeos íntimos na internet. Muitas vezes, a pedido do namorado e até das próprias amigas. Tem até uma brincadeira nas escolas chamada “Ato de Coragem”, que acontece como um desafio — “Você tem coragem de…”. Então, para ela mostrar que é corajosa, ela posta fotos íntimas ou vídeos no grupo. A informação hoje é o melhor caminho. Por isso, a importância da palestra. Até mesmo para explicar sobre as questões legais que estes tipos de brincadeira implicam. Na palestra, por exemplo, eu conto o caso de uma moça que postou uma foto íntima na internet há seis anos e que, até hoje, encontra dificuldades para arrumar emprego por conta disso. No entanto, mesmo com o apoio para falar sobre estes assuntos na palestra, ainda há um bloqueio para tratar sobre Educação Sexual na grade curricular. É importante frisar que, na escola, tem que ser dado Educação Sexual e não Orientação Sexual. A orientação tem que vir de casa, vem dos pais. O caráter da criança é formado entre os quatro e os seis anos, então, isso já vem de casa. A Educação Sexual precisa ser tratada nas escolas desde a infância. A sexualidade é como a personalidade, precisa ser tratada como uma coisa natural e do ser humano.

DL - Que dica você daria para os pais que não sabem tratar sobre este assunto em casa?

Christiane - Eles devem se informar, sempre. Para tratar de sexo, não tem idade. As crianças têm suas curiosidades. Então, os pais precisam atentar para o que as crianças estão perguntando e responder o que elas querem saber. Mas é preciso procurar saber antes de responder o que ela exatamente está perguntando. Por exemplo, uma criança que quer saber o que é virgem, não exatamente está falando com um cunho sexual, pode só querer saber qual é o signo. É preciso tratar com muita naturalidade.

DL - Na questão do sexting, o que você acha que leva um adolescente a se expor desta forma? O que faltou na criação desta criança?

Christiane - Faltou o equilíbrio. Uma adolescente emocionalmente equilibrada pensaria duas vezes antes de postar um vídeo íntimo. Se ela receber de casa toda a informação de como isto funciona, ela não faria. Porém, ainda sim, ela poderia ser impulsionada pela questão do furor da adolescência. Como acontece muito, por exemplo, de o namorado pedir uma foto íntima como prova de amor ou postar um vídeo em quem eles estejam praticando sexo. Acontece muito.

DL - Nas escolas que você passou com a palestra, tem muitos casos como este exemplo?

Christiane - Sim, muito. No final de cada palestra, eu dou um tempo para que eles façam perguntas e a gente possa discutir sobre seus questionamentos. Em todas as escolas que eu estive, sempre tem um caso de alguma aluna que postou e passou por isso.

DL - O que isso causa emocionalmente em uma garota?

Christiane - Causa um estrago imenso. Algumas chegam ao suicídio por causa do sexting. Infelizmente, isto é pouco divulgado. Sem falar que causa estresse, depressão, vontade de matar, síndrome do pânico. Muitos não querem mais voltar à escola.

DL - Diante de uma situação de exposição como esta, como os pais devem agir?

Christiane - Isso desestrutura uma família inteira. A primeira coisa que deve ser feita é a denúncia, se não foi o próprio adolescente que postou, e procurar uma ajuda psicológica imediatamente para toda a família. Caso a postagem tenha sido feita pelo próprio adolescente, após a retirada do vídeo é preciso fazer um acompanhamento para que este vídeo não seja compartilhado novamente.

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