quinta-feira, 25 de maio de 2017

Papel dos professores vai além do número de horas que ensinam, diz a OCDE

EDUCARE PT

A maioria dos adolescentes está feliz. Mas a ansiedade com os trabalhos escolares e o bullying são ainda sérios problemas. O bem-estar dos alunos depende também da relação com os seus professores, diz a OCDE, num relatório que foca a satisfação dos jovens com o ambiente escolar.
Andreia Lobo

Os adolescentes que se sentem integrados na comunidade escolar e têm boas relações com os pais e os professores são mais propensos a ter um melhor desempenho académico e a sentirem-se mais satisfeitos com suas vidas. A conclusão é retirada da primeira avaliação realizada pelo PISA 2015 ao bem-estar dos alunos. 

Em média, em todos os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), a maioria dos alunos de 15 anos de idade consideram ter uma vida feliz. Relatam um nível de 7,3 numa escala de satisfação que varia de 0 a 10. Mas há grandes diferenças entre os países. Enquanto menos de 4% dos estudantes na Holanda disse aos investigadores da OCDE não se sentirem satisfeitos com a sua vida, na Coreia e na Turquia são mais de 20%. 

Os resultados analisam, pela primeira vez, a motivação dos alunos para um bom desempenho escolar, as suas relações com os colegas e os professores, a sua vida familiar e a forma como passam o seu tempo fora da escola. 

As informações foram recolhidas através de um exame realizado a 540 mil estudantes de 72 países e economias parceiras da OCDE, que também participaram no teste principal do PISA 2015, que avalia os conhecimentos dos alunos de 15 anos nas áreas da ciência, matemática e leitura. 

Muitos estudantes revelam-se bastante preocupados com os trabalhos da escola. A análise feita pela OCDE mostra que a ansiedade não está relacionada com o número de horas de aulas ou de testes, mas com o apoio que sentem por parte dos seus professores. 

Em média, 59% dos alunos de 15 anos dizem-se preocupados com a possibilidade de fazer um teste difícil e 66% stressa por causa das más notas. Cerca de 55% dos alunos sentem-se muito ansiosos nos testes, mesmo que estejam bem preparados. Em todos os países, as raparigas registaram mais ansiedade relacionada com a escola do que os rapazes. Más notícias, diz a OCDE, porque “a ansiedade relacionada com os trabalhos escolares, os trabalhos de casa e testes está negativamente relacionada com o desempenho”. 

A maioria dos alunos nos 67 países e economias da OCDE sente que pertence à escola. No entanto, os alunos em situação de desvantagem são 7,7% menos prováveis de ter esse sentimento, bem como os estudantes imigrantes de primeira geração, 4,6% menos que os estudantes nativos. 

Em matéria de desempenho na escola, as raparigas, mais do que os rapazes, declaram querer melhores notas e ser capazes de escolher entre as melhores oportunidades quando se formam. Mas os rapazes são mais ambiciosos do que as raparigas e, ao contrário delas, desejam sempre ser os melhores em tudo o que fazem. 

O relatório mostra ainda que, em média em todos os países da OCDE, 44% dos alunos de 15 anos esperam concluir a universidade. Na Colômbia, Catar e nos Estados Unidos, mais de três em cada quatro alunos aspira a ter um diploma. 

Professores e pais podem fazer a diferença 
A análise da OCDE conclui que “os professores desempenham um papel importante na criação das condições para o bem-estar dos alunos na escola”. Como tal, acrescenta a organização, “os Governos não devem definir o papel dos professores apenas através do número de horas de ensino”. 

O professor pode, por exemplo, ajudar o aluno a reduzir o nível da ansiedade com o trabalho escolar, simplesmente ensinando-o a aprender com os erros. Uma maneira de incentivar uma atitude positiva em relação aos erros, sugere a OCDE, é mostrar os erros mais comuns que a turma fez num teste e deixar que os alunos os analisem juntos. Além disso, os professores podem ajudar os alunos a estabelecer metas realistas – mas desafiadoras – para si próprios. Como se sabe, os alunos têm maior probabilidade de valorizar o que aprendem quando podem atingir metas que eles próprios estabeleceram. 

Assim, fica provado que os alunos mais felizes são os que referem ter um relacionamento positivo com seus professores. De facto, o PISA constatou que a perceção de uma relação negativa com os seus professores é uma das principais ameaças ao sentimento de pertença à escola. 

Como construir melhores relações entre docentes e alunos? A OCDE responde que os professores devem ter formação em métodos básicos de observação, escuta e comunicação intercultural. Assim, poderão atender melhor às necessidades individuais dos alunos. A troca de informações sobre a personalidade, as dificuldades e os pontos fortes dos alunos, entre professores de uma mesma turma, poderá ser útil na elaboração de estratégias para que os alunos se sintam integrados na comunidade educativa. 

Importante é ter em conta que também os pais são responsáveis pelo bem-estar escolar dos seus filhos. Os alunos cujos pais relataram “gastar tempo apenas a conversar com o meu filho”, “comer a refeição principal à mesa com o meu filho” ou “discutir o quão bem o meu filho está a ir na escola” mostraram-se entre 22% e 39% mais propensos a relatar níveis elevados de satisfação com a vida. O impacto desta satisfação ao nível académico também é significativo, diz a OCDE. 

Um aluno por turma vítima de bullying 
A vida social dos alunos na escola foi alvo de análise neste relatório. Um em cada cinco alunos afirmou aos investigadores já se ter sentido injustiçado pelos seus professores, algumas vezes num determinado mês. Fosse por uma repreensão disciplinar exagerada, ofensas ou ridicularização em frente aos colegas. Ainda na escola, as raparigas são menos vítimas de agressões físicas do que os rapazes, mas mais suscetíveis de serem objeto de rumores desagradáveis. 

A pesquisa revelou ainda que o bullying é uma questão importante. Nas escolas onde o bullying é frequente os estudantes obtêm menos 47 pontos percentuais nos testes do PISA do que em escolas onde é menos frequente. 

A proporção de estudantes que se afirmam vítimas é grande. Em média, em todos os países da OCDE, cerca de 4% dos estudantes – cerca de um aluno por turma – dizem que são atingidos ou empurrados pelo menos algumas vezes por mês. A percentagem varia de 1% a 9,5% entre os países. Os dados mostram que há menos casos de bullying nas escolas onde os alunos gostam mais de quem os ensina, confirmando a importância do bom relacionamento com os professores. 

Os pais também precisam de estar envolvidos na resolução deste problema. Mas não chega, diz a OCDE, recomendando mais colaboração entre escolas e outras instituições e serviços que atuem nesta área, com o objetivo de implementar planos de prevenção e respostas mais abrangentes. 

Um programa anti-bullying eficaz tem também de incluir uma componente de formação de professores sobre comportamento de bullying e como lidar com isso, diz a OCDE. Inquéritos anónimos aos alunos, para monitorar a prevalência de casos e estratégias para fornecer informações e envolver os pais, são instrumentos que, segundo os investigadores, podem ajudar a resolver o problema. 

Uso do tempo fora da escola 
“Melhorar o bem-estar dos alunos na escola passa, também, por ensinar aos jovens os benefícios de um estilo de vida ativo e saudável através da educação física e da saúde”, lê-se no capítulo que analisa o modo como os alunos passam o tempo fora da escola. 

Cerca de 6,6% dos estudantes não realizam qualquer tipo de atividade física moderada ou vigorosa fora da escola. As raparigas são 1,8% fisicamente mais inativas que os rapazes. São dados preocupantes, uma vez que, segundo o estudo, “os alunos que não participam em qualquer tipo de atividade física fora da escola são mais suscetíveis de ignorar a escola, se sentirem estranhos na escola, muito ansiosos quanto ao trabalho escolar ou serem frequentemente intimidados”. 

Outro indicador recolhido nesta análise mostra que, em média, entre os países da OCDE, cerca de 23% dos estudantes trabalham para pagar os estudos. E 73% diz fazê-lo em casa antes ou depois da escola. Os rapazes são os que mais declaram ganhar dinheiro a trabalhar, as raparigas são as que mais se ocupam de tarefas domésticas não remuneradas. 

Segundo o estudo, o acesso à Internet universalizou-se nos países da OCDE: 95% dos jovens de 15 anos dizia ter net em casa, em 2015. Depois da escola, os estudantes passam mais de duas horas online durante um dia típico da semana e mais de três horas durante um típico dia de fim de semana. Entre 2012 e 2015, o tempo gasto na Internet fora da escola aumentou cerca de 40 minutos por dia em dias de semana e fins de semana. 

Raparigas e alunos desfavorecidos são mais “infelizes” 
Voltando aos níveis de felicidade dos adolescentes, a maioria dos jovens de 15 anos de idade está feliz com as suas vidas. No entanto, raparigas e os alunos desfavorecidos são os grupos que se sentem mais insatisfeitos. Entre as adolescentes de 15 anos, esta “infelicidade” “é possivelmente um reflexo da autocrítica áspera das raparigas, particularmente relacionada com a sua imagem dos seus próprios corpos num momento em que estão a passar por grandes mudanças físicas”, avança a OCDE. 

O PISA 2015 não recolheu dados sobre a imagem corporal dos alunos, mas os resultados sobre os hábitos alimentares revelam que as raparigas têm mais predisposição do que os rapazes para não comer nada ao pequeno-almoço nem ao jantar. 

De novo, os estudos em matéria de imagem feminina sugerem que a exposição a conceitos de beleza personificados em mulheres excessivamente magras nos media tradicionais e sociais tem um impacto negativo na satisfação das jovens consigo mesmas. As causas deste fenómeno são complexas. A atuação dos meios de comunicação na promoção dos estereótipos de género parece ser prejudicial ao bem-estar das jovens, alertam os peritos da OCDE, garantindo que esta questão terá de ser melhor analisada. 

Durante a apresentação do relatório “O bem-estar dos alunos: resultados do PISA 2015”, feita em Londres, a 19 de abril, Gabriela Ramos, chefe de gabinete da OCDE, destacou o quanto estas descobertas mostram como professores, escolas e pais podem fazer a “verdadeira diferença”: “juntos, podem ajudar os jovens a desenvolverem um sentido de controlo sobre o seu futuro e a resiliência de que precisam para ter sucesso na vida”.

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