domingo, 20 de março de 2016

Little Boy – Além do Impossível (2015): a fé pode mover uma montanha?

É tudo tão doce e tão ameno no longa que ele passará despercebido. Melhor assim: analisando atentamente, as virtudes ficam bastante prejudicadas pelas falhas.

Diogo Rodrigues Manassés twitter.com/diogo_rm

A fé pode mover montanhas? Não seria melhor falar em esperança? Quem acredita sempre alcança? E se não depender apenas de si? O viés religioso é inafastável em tais casos?
Esses e outros questionamentos estão presentes em “Little Boy – Além do Impossível”, coprodução entre México e EUA cujo protagonista é Pepper Busbee, garoto de 8 anos de fé inabalável. Sua vida se divide entre o bullying sofrido em razão da sua baixíssima estatura e a amizade intensa que tem com seu pai, com quem vive aventuras fantasiosas como se fossem ambos crianças. Porém, quando seu irmão é rejeitado pelo exército estadunidense, quem se ausenta do lar para atuar na Segunda Guerra Mundial é seu pai, deixando o garoto na expectativa pelo retorno.
O norte do plot é bastante claro: a relação entre pai e filho. Com a ida daquele para a Guerra, o roteiro aposta em alavancas narrativas: Ben Eagle (Ben Chaplin, caricato como devia), mágico que faz a iniciação de Pepper na crença no impossível; padre Oliver (Tom Wilkison, muito bem), que sugere ao garoto seguir alguns mandamentos de conduta (a “Lista Ancestral”) que, se seguidos, poderiam ajudar no retorno do seu pai (argumentação derivada de uma explicação teológica); e Hashimoto (Cary-Hiroyuki Tagawa, excelente), pessoa Pepper odiava por reflexo do restante da sociedade. Ou seja, são três personagens que colaboram para o objetivo de Pepper, que é ter o pai ao seu lado novamente. Permeando tudo isso, a importância da fé (ou esperança, pois a visão teológica que o padre sugere não chega a ser acolhida pelo menino, ao menos não de forma pura), conduz Pepper na narrativa.
De todas as subtramas, a do preconceito sofrido por Hashimoto é a mais fascinante (e a ótima atuação de Tagawa ajuda bastante). Residente nos EUA desde a infância, sua descendência nipônica é motivo de ódio e marginalização por parte dos demais cidadãos (afinal, o período é de Segunda Guerra). Ele é encarado por todos como inimigo, e Pepper, de forma reflexa, faz o mesmo – ao menos até seguir as recomendações do Padre Oliver. A amizade que se forma entre Hashimoto e Pepper tem algum encanto, todavia, não chega ao nível de “Up: Altas Aventuras”, por exemplo. As demais subtramas são burocráticas, como a do irmão rebelde e malsucedido (David Henrie, convincente) e a do médico cuja intenção é assumir a posição de patriarca na família Busbee (Kevin James, idem).
Como se percebe, o roteiro é elaborado de forma razoável – exceto pela narração voice over usada como muleta –, com uma concatenação fática coerente – exceto por um plot twist desnecessário e reducionista – e formulação de personagens verossímeis. Entretanto, padece de um mal incurável (além das exceções mencionadas): é extremamente previsível. É aquele tipo de filme para reconfortar pessoas desanimadas e arrancar emoções fáceis (usando uma criança, o que facilita ainda mais). Tudo leve e inofensivo – até demais.
Outros elementos técnicos também são excessivamente amenos: a direção é despida de dramaticidade, mesmo em cenas que a exigiriam (como a despedida do pai), além de filmar de forma clichê, com planos gerais para ambientação e closes para comoção; a fotografia é insossa; a trilha sonora é insignificante. Destaque positivo apenas para a montagem: alternada em alguns momentos (como a que faz analogia entre o bullying sofrido por Pepper e uma batalha de que o pai participa) e remissiva em outros (fazendo referências claras awesterns e filmes de samurais). Dá um tom fantástico benéfico, que, porém, só atenua os demais aspectos ruins.
“Little Boy – Além do Impossível” acolhe uma temática aprazível, coloca um infante como protagonista para emocionar mais – a atuação do carismático Jakob Salvati é espetacular, dando um up nos demais artistas, que já estão em bom nível – e dá uma condução dotada de imensurável brandura, tornando o longa quase infantil. Uma ou outra acidez se faz presente (em especial nas provocações de Hashimoto ao defender a “fé em si mesmo” e ao usar a expressão “amigo imaginário do céu”), mas fato é que o diretor Alejandro Moneverde entrega um produto (seu segundo longa) tão suave que passará despercebido pelos cinemas. Contudo, a mensagem que deseja passar fica bastante clara: a fé pode mover uma montanha.

Nenhum comentário:

Postar um comentário