quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Nas escolas, os rapazes são sobretudo vítimas do bullying homofóbico

Educação - Portal do Distrito
por Rosa Duarte
(Professora)
 


Há dias, depois do noticiário das oito da noite, estava sentada no sofá da sala em frente ao televisor, quando apanhei a meio uma reportagem sobre jovens em risco. Hesitei, mas acabei por me prender (é que são sempre impressionantes de tão reais…). Não me acrescentou muito ao que já sabia, mas ouvi com apreensão as atuais estatísticas que apontam o suicídio como a segunda causa de morte dos adolescentes, liderada pelos acidentes de viação.

Infelizmente o problema do bullying não é um problema social só da atualidade. Apenas se tornou mais visível pela sua ação de combate. A importação do termo é evidentemente mais recente do que os maus-tratos verbais e físicos infligidos aos seres vulneráveis, que são menos iguais, dentro e fora do nosso país.  

A denúncia é a atitude acertada no sentido da sua resolução, para que melhor se possa ajudar com experiência e eficácia. Os casos mais complicados, que demoram a ser detetados, são aqueles que habitualmente são minimizados e descredibilizados pelos habilidosos agressores que procuram por todos os meios influenciar o ambiente humano à volta, com o intuito de neutralizar possíveis queixas ou sinais dados pela vítima, derrubando quaisquer intenções de denúncia. E os próprios, com vergonha ou medo, deixam-se andar, às vezes preferindo convencer-se de que os outros é que têm razão, e autoinfligindo-se. Ou então esperam, quem sabem em vão, resolvê-los por conta própria.

Os mais vulneráveis, sabemos, são os menos experientes, logo os mais jovens. Mas não apenas necessariamente… Quando se quer agredir, mesmo em idades mais avançadas, basta acionar um mecanismo gradual de isolamento social para a pessoa em causa. E assegurar o seu ostracismo distorcendo a imagem social dessa pessoa, afim de secar quaisquer tentativas do próprio se defender, pondo-o a ridículo. O requinte pode levar à nomeação de um pseudoamigo para se aproximar e vigiar os pensamentos da vítima, conquistando-lhe a amizade e construindo um disfarce de igual vítima dos mesmos agressores, mostrando-se afável publicamente para sanar qualquer suspeição de coação psicológica ou agressão verbal. E isto foi-me retratado por uma jornalista idónea, com quem converso regularmente, e está a fazer o levantamento de situações como estas, reais, nas escolas e na sociedade em geral, entre alunos e não só…

É certo que a vida tem adversidades para todos e que a sobreproteção também pode ser um problema quase tão grande como o bullying. Que muitas vezes é uma reação natural, ainda que excessiva, de controle e proteção contra, nomeadamente, o bullying. Há pais, e sobretudo mães, que querem tanto aos seus filhos que não os deixam lidar eles próprios com as situações adversas, quando até certo ponto são próprias do processo de integração e crescimento desses jovens. E não sabem, os mesmos pais, como intervir na medida certa no momento adequado. O apoio especializado (médico e pedagógico) é fundamental e deve estar o mais acessível e divulgado possível, sobretudo em cada comunidade educativa.

Com filhos únicos e crianças com alguma debilidade, registam-se sensivelmente mais situações de superproteção que, mais tarde em adultos, se vão traduzir por uma adaptação mais lenta a situações sociais novas, com uma menor preparação psicológica para os embates mais inesperados do quotidiano. Os desgostos amorosos são exemplos sintomáticos. Vários exemplos reais poderiam aqui ser citados, mas basta referir o conhecido personagem Pedro da Maia na obra-prima de Eça de Queirós, Os Maias, que é uma real caricatura social de um tipo de educação à portuguesa, segundo o olhar atento e crítico do seu autor sempre atual.

Embora cada vez mais os pais estejam cada vez menos disponíveis para acompanhar os filhos, melhor ou pior na sua educação, devido em particular ao aumento de horas de trabalho, a verdade é que a sua experiência de vida os tem apetrechado e aproximado dos mesmos, pois eles já têm a experiência do ambiente escolar e, muitos deles, em ambiente urbano e populoso. Muitos pais percebem que a prática de atividades extracurriculares ajudam os seus filhos a acrescentar mais competências ao seu desenvolvimento, sejam elas físicas, emocionais, artísticas e/ou outras. O interesse pessoal é um bom ponto de partida para a autoimagem e deve ser encorajado. E desenvolver talentos pessoais fortalece os vulneráveis e desmoraliza os agressores. Reforça a autoestima e ajuda à integração social. E essa ideia que, erroneamente, se quer passar de que há pessoas com excesso de autoestima, não é de todo verdadeira. Quem investe mais na sua afirmação pessoal, pode ser mal interpretado e dificultar o seu papel de interação social, mas é indubitavelmente um claro sintoma de que há carências que precisam de ser superadas. Talvez haja, sim, mais autoconfiança.

Hoje é muita a informação. Há já ações de ajuda para o bullying (embora não as necessárias...) Há mais comunicação entre as escolas e os encarregados de educação.

Então o que é que falha?

É ainda necessário um processo educativo alargado a todos os educadores (que devem estar atentos), dentro e fora da escola, que liberte a nossa cultura de preconceitos e de ações de rejeição, nomeadamente das atitudes homofóbicas imaturas frequentes, fruto de uma mentalidade ainda estigmatizada por um passado repressor.

É que os nossos jovens rapazes continuam a ser as principais vítimas do bullyinghomofóbico.

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